Guaranis da Ponta do Arado denunciam violações do Arado Empreendimentos Imobiliários

Idioma Portugués
País Brasil
- Foto tomada del sitio web de Sul21

Assista à denúncia dos mbya guaranis da Ponta do Arado sobre o isolamento involuntário e sobre o monitoramento compulsório que veem sofrendo por parte da Arado Empreendimentos Imobiliários.

No dia 15 de julho, à beira do Guaíba, no bairro Belém Novo, no que hoje é o extremo sul da cidade de Porto Alegre, famílias de guaranis retomaram suas terras ancestrais, onde vivem diversas espécies de animais em uma área de mata de banhado, própria daquele local. Depois de seis meses, passaram pelo inverno rigoroso de Porto Alegre e hoje, segundo o Cacique Timóteo Karay Mirim, são uma aldeia, a Tekoa Yjere – que significa “ilha”, como os guaranis vêem à Ponta do Arado. Atualmente, eles e quem os visita só conseguem chegar na aldeia de barco. Neste período de meio ano, os indígenas também resistiram às iniciativas de coerção e ameaças por parte dos seguranças e funcionários do Arado Empreendimentos Imobiliários. A administração do Empreendimento impôs uma cerca e mantem um posto de guarda dos seguranças imediatamente após o arame. Restringe o caminho terrestre à aldeia, mas também busca impedir os indígenas de buscar água e lenha. Busca limitar os indígenas a um pequeno território de praia.

No dia 19 de dezembro, Amigos da Terra Brasil e Coletivo Catarse, com apoio de outras organizações, estiveram na retomada para denunciar as violações e ameaças que os guaranis estão sofrendo.

São elas: a imposição de uma cerca, que restringe o acesso dos guaranis à água e à lenha, e também restringe a área de marinha onde estão, área que legalmente é pública; o monitoramento constante das atividades dos indígenas, com filmagens frequentes, sendo que os seguranças do Arado Empreendimento armaram seu acampamento de guarda imediatamente ao lado da cerca, a pouquíssimos metros das barracas dos indígenas; a ameaças como a de soltarem búfalos na área que os indígenas vivem. Logo após a retomada, em julho, o barco de um apoiador à causa dos indígenas foi sabotado.

Posto de guarda dos seguranças da Arado Empreendimentos, instalado imediatamente após a cerca, a poucos metros das barracas dos guaranis. Na denúncia em vídeo, gravado pelo Coletivo Catarse, o Cacique Timóteo ressalta que a construção da cerca é uma ação fora da lei, um isolamento involuntário em área de marina, que legalmente é um local público. Por isso mesmo os indígenas não podem respeitar essa imposição.

Durante nossa visita à Tekoa Yjere, a Polícia Militar foi chamada devido ao fato de estarmos filmando a cerca e o acampamento de guarda dos seguranças. Medida descabida, sendo que os próprios seguranças, segundo relato dos guaranis, filmam a aldeia frequentemente, dia e noite.

No dia seguinte à nossa visita à retomada (quinta, dia 20), em represália ao fato dos indígenas se mobilizarem com apoiadores para denunciarem o que veem sofrendo, os funcionários da fazenda instalaram, junto à cerca, sensores, que alertam os seguranças se a cerca for cruzada. Atitude que ameaça ainda mais os indígenas na simples busca por água, direito básico, e lenha, para se aquecer e cozinhar.

Na sexta, dia 21, o cacique Timóteo Karay Mirim foi até a 7ª Delegacia da Polícia Civil fazer um Boletim de Ocorrência para denunciar estas ações de coerção e de ameaça psicológica do Arado Empreendimentos. O Ministério Público também será acionado sobre essas violações.

As denúncias estão concentradas no vídeo abaixo, que também é possível compartilhar através da página do Coletivo Catarse no Facebook. É imprescindível que compartilhemos e fiquemos atento ao que se passa na Ponta do Arado.

Em Maquiné, os guaranis disputavam a posse da terra, na Justiça, com o Estado do Rio Grande do Sul. Na Ponta do Arado, as famílias guaranis que ali estão enfrentam a especulação imobiliária das grandes construtoras e a lógica dos condomínios fechados, a cidade para poucos. Enfrentam um projeto milionário do Arado Empreendimentos, que, em parceria com a construtora DAHMA, pretende construir mais de 2000 mansões, divididas em três condomínios na região da Fazenda do Arado Velho. A iniciativa é dos investidores Iboty e Eduardo Ioschpe. A comunidade do Bairro Belém Novo e diversas pessoas se mobilizam nos últimos anos contra este empreendimento.

Sobre as Retomadas

Airton Krenak, da etnia Krenak (assolada pela lama tóxica no Rio Doce, maior crime socioambiental da história, das empresas impunes Samarco/Vale do Rio Doce), certa feita, em uma aula inaugural da UFRGS em 2017, comentou sobre o fato da luta pela demarcação de terras indígenas ser uma medida de garantia para os povos, mas ainda assim ser uma medida colonial, por legitimar a demarcação, os limites, as fronteiras, referenciais do homem branco. Essa discussão parece tão distante no contexto em que vivemos no Brasil, em que há anos as demarcações já não vinham acontecendo como reinvindicadas e que, atualmente, com o presidente Jair Bolsonaro (PSL), promete piorar, no nível de demarcações já feitas serem revistas. Já começou. No Maranhão, no dia 16 de dezembro, o povo Tremembé teve suas casas e plantações destruída por tratores do estado com escolta do Batalhão de Choque. Um desalojo puxado indevidamente pela Justiça Estadual, sendo que os Tremembé estavam com processo correndo de demarcação na Justiça Federal. 

Ao mesmo tempo, pensar além das demarcações parece tão próximo das atitudes dos guaranis e de outros povos originários. No Rio Grande do Sul, mbya guaranis retomaram, no município de Maquiné, montanhas com Mata Atlântica (bioma em vias de extinção), ocupadas por esse povo desde antes da chegada dos europeus ao Brasil. Lá, na Tekoá Kagua Porã, construíram uma escola autônoma de fomento ao saber indígena, viveram a colheita de milho e, recentemente, no começo de dezembro, souberam que o Estado do Rio Grande do Sul abdicou na Justiça da posse daquela terra – que por um tempo foi a sede da Fepagro, fundação extinta pelo Governo Ivo Sartori. Em um contexto adverso, cenário genocida, no Mato Grosso do Sul, os guarani-kaiowás lutam através de retomadas há anos pelo mantenimento do seu povo em terras ancestrais. Enfrentam, as escopetas dos capangas dos fazendeiros, acobertados pelas polícias locais e federais (assista o filme Martírio [2017] ou acompanhe o CIMI).Vários são executados, outros tantos estão se suicidando por causa deste cenário. Mesmo assim não aceitam sair das terras em que há muitas gerações vivem.

Enquanto o presidente Jair Bolsonaro diz que os indígenas precisam receber o mesmo “tratamento digno do restante da população”, muitos povos originários decidem retomar suas terras, colocar o seu corpo pelo mantenimento dos seus modos de vida, resistindo ao genocídio e ao etnocídio, que nunca parou de acontecer na história do Brasil.

Os guaranis da Ponta do Arado se referem ao responsável pela gerência da fazenda como “capataz”. Sofreram ameaças de terem búfalos soltos onde vivem. Pelo Brasil, notícias de, no Sertão Pernambucano, escola do Povo Pankararu queimada, base da Funai de proteção a índios isolados atacada por homens armados. Estes são exemplos de notícias, deste último mês de 2018, que mostra que ainda vivemos a disputa pela terra e os ataques aos povos originários do período colonial.

Fonte: Amigos da Terra - Brasil

Temas: Defensa de los derechos de los pueblos y comunidades, Pueblos indígenas, Tierra, territorio y bienes comunes

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