Brasil: Justiça proíbe uso de agrotóxicos, entre eles o glifosato
Os químicos Abamectina, Glifosato e Tiram foram proibidos devido a inúmeros estudos que apontam seus danos à saúde humana e ao equilíbrio ambiental. Produtos já licenciados devem ser retirados do mercado em até 30 dias; novas licenças estão suspensas. Anvisa tem prazo até o final do ano para concluir reavaliação toxicológica. Decisão ainda pode ser revertida, mas representa uma grande vitória de quem defende a vida, a saúde e o meio ambiente por meio da agroecologia.
Uma decisão da 7ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal proíbe o uso dos agrotóxicos abamectina, glifosato e tiram no Brasil. Segundo a juíza que proferiu a ordem, “está mais que suficientemente demonstrada a toxidade dos produtos para a saúde humana”, não restando dúvidas à necessidade da proibição. A conclusão judicial vem embasada por inúmeros estudos que apontam a alta nocividade destes químicos.
O glifosato é o agrotóxico mais utilizado no Brasil, em especial por produtores de soja. A Organização Mundial da Saúde (OMS), a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC, na sigla em inglês), a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e o Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca) já se posicionaram sobre os malefícios da substância: para a IARC, o glifosato reduz a produção de progesterona em mamíferos, afeta a mortalidade de células placentárias e é supostamente carcinogênico; a OMS e a Abrasco o classificaram como “provável carcinógeno humano” – em uma escala de 1 a 5 da OMS, este é o segundo maior risco que pode ser dado a uma substância.
Segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), a exposição de animais ao glifosato causou “aumento significativo das aberrações cromossômicas e de presença de micronúcleos”. O Inca também apontou os malefícios do glifosato para a saúde humana, que contribuem para o aumento da taxa de mortalidade.
O Ministério da Saúde registra de 12 a 14 mil intoxicações por agrotóxicos no Brasil a cada ano – em 2016, foram quase 500 vítimas fatais. E a OMS estima que somente um em cada 50 casos cheguem às autoridades, o que aumentaria o registro de intoxicações para cerca de 650 mil por ano. Leia mais no site da campanha Agrotóxico Mata: Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida
A principal produtora do glifosato é a Monsanto, que o vende sob o rótulo “Roundup”. A empresa de venenos foi recentemente comprada pela Bayer (que produz os remédios para as doenças que, agora, ela própria cria). Em julgamento em 2017 nos Estados Unidos, ficou comprovada a manipulação de dados pela Monsanto a favor de seu veneno: a empresa havia contratado, em sigilo, cientistas para que produzissem dados em defesa do químico. Ou seja, as pesquisas que minimizam os efeitos danosos da substância não possuem credibilidade alguma: são encomendados pela própria culpada, a Monsanto. Ainda assim, devido ao forte lobby empresarial, o glifosato, que estava prestes a ser barrado na União Europeia, ganhou validade de mais cinco anos por lá; e a situação brasileira é muito mais grave: aqui, o limite de uso de glifosato é 200 vezes maior que no bloco europeu.
A abamectina já é proibida na União Europeia. De acordo com nota da Anvisa, a substância “apresenta resultados preocupantes relativos à toxicidade aguda e suspeita de toxicidade reprodutiva dessa substância e de seus metabólitos”. Outro grave problema deste químico está na contaminação de recursos hídricos consequentes de seu uso no solo. Sobre o tiram, estudos indicam ser “provocador de efeitos neurocomportamentais, como ataxia, convulsões, letargia e malformações fetais severas, devido à existência de dissulfeto de carbono dentro de sua composição”.
“São estarrecedoras as conclusões da Fundação Oswaldo Cruz acerca do uso de abamectina, utilizando-se como base pesquisas experimentais realizadas em camundongos, macacos, cães ou coelhos, quando todos eles apresentaram sintomas e danosos que vão desde a irritação da pele até perda de peso, taquicardia e mutações no DNA” – Luciana Raquel Tolentino de Moura, 7ª Vara da Justiça Federal do DF
Além da proibição imediata de novas licenças para produtos à base destes três químicos e do prazo de 30 dias para retirada de mercado de produtos anteriormente licenciados, foi dado o prazo de 31 de dezembro deste ano à Anvisa para que finalize a reavaliação toxicológica das três substâncias. Esta reavaliação se arrasta desde 2008 – no Brasil, uma vez dada a licença a um agrotóxico, ela é permanente, podendo ser alterada somente mediante novo estudo. A multa estipulada, caso o prazo não seja respeitado, é de R$ 10 mil por dia.
Movido pelo Ministério Público Federal, o processo corre desde 2014. Leia AQUI a decisão judicial na íntegra (na nova janela, vá até a aba “Inteiro Teor” e acesse a última decisão, de 03/08/2018).
PL DOS AGROTÓXICOS
Os agrotóxicos são prejudiciais tanto a quem aplica o veneno quanto a quem o consome; e se beneficiam deste envenenamento geral da população apenas grandes empresas como Monsanto, Bayer, Syngenta ou Taminco, todas citadas no processo, além dos grandes produtores de soja e outras monoculturas, que usam amplamente venenos em sua produção e lutam contra a proibição destes químicos – e, em consequência, contra a saúde pública.
Recentemente, veio à tona um projeto de lei (PL), em trâmite no Congresso Nacional, que pretende flexibilizar a concessão de registros para agrotóxicos. Em nota, o MPF destaca os riscos desta medida, que “está na contramão da preocupação mundial com o meio ambiente e a saúde”. Pesquisadoras e pesquisadores da Abrasco e da Associação Brasileira de Agroecologia lançaram recentemente um dossiê científico contra o PL, também o condenando.
Fonte: Amigos da Terra