“Vamos defender a reforma agrária e o MST”, aponta dirigente de Pernambuco
"Agora estamos enfrentando o fascismo e eu acho que nós vamos vencer porque o governo passa e o movimento continua", afirma Jaime Amorim, catarinense de nascimento e pernambucano de coração. Integrante da Direção Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) está em Pernambuco desde o nascimento do MST no estado.
Em entrevista ao Brasil de Fato, Amorim faz um balanço da trajetória de 30 anos do movimento em áreas como educação, formação e produção agroecológica. O dirigente também lembra pessoas, lugares e mobilizações históricas para que o MST em Pernambuco seja o que é hoje, além dos desafios a serem enfrentados na atual conjuntura.
"Eu diria que temos outros desafios futuros, o primeiro é continuar massificando a luta pela reforma agrária, fazendo ocupações, organizando os acampamentos que já existem, apesar da conjuntura difícil que estamos vivendo de um governo fascista. Mas nós vamos nos defender, defender a reforma agrária e defender o MST, porque eles querem destruir o MST como organização que luta contra o latifúndio e pela reforma agrária", ressalta Amorim.
Confira a entrevista completa:
Brasil de Fato: Quais as principais conquistas do MST em Pernambuco nesses 30 anos?
Jaime Amorim: Vou subdividir em vários pontos as principais conquistas do MST em Pernambuco. A primeira é o movimento ter sobrevivido 30 anos enfrentando todas as adversidades possíveis. Aqui é um estado que tem um latifúndio estruturado, histórico na zona canavieira.
Na prática os estudos mostram que são 38 famílias que dominam a zona canavieira, um domínio de cinco séculos. 42 usinas que exploraram, escravizaram a terra, as pessoas e empobreceram o campo em Pernambuco, como também o latifúndio estrutural. A violência é inerente ao latifúndio. O latifúndio não consegue sustentar toda essa estrutura sem a violência. Então, eu acho que a principal conquista desses 30 anos é sobreviver, estruturar e organizar o movimento.
Mesmo com a adversidade conjuntural atual, o movimento está fortalecido, tem uma coordenação ampla e preparada para os desafios do momento. A segunda conquista é a nossa base. Nós temos 226 assentamentos conquistados, famílias que possivelmente hoje estariam morando nas periferias das cidades; jovens completamente isolados e que a gente conseguiu durante esses 30 anos assentar essas famílias nesses 226 assentamentos, onde vivem, têm casa, estudam e trabalham, produzem. Essa é uma conquista importante.
São 14 mil famílias, isso multiplicado por cinco é muito maior que as cidades médias de Pernambuco. O número de pessoas que já são assentadas e mais 16 mil famílias que vivem em 163 acampamentos no estado que estão lutando pela reforma agrária.
Podemos, também, falar de conquistas no campo da educação. Nós conseguimos, nesse período, alfabetizar quase todas as famílias que vivem nos assentamentos, isso dá dignidade para as pessoas, elas passaram a pertencer e isso é importante na história atual. Elas pertencem ao MST, fazem parte de um processo de luta. Nós podemos citar algumas conquistas concretas objetivas de áreas que foram símbolos desse processo.
A primeira conquista foi a Fazenda Serra Negra, que foi o primeiro assentamento conquistado. Ainda em 1991 foi criado o primeiro assentamento no estado de Pernambuco que é o assentamento Serra Negra com 65 famílias assentadas no município de Floresta. A partir daí, se criou a possibilidade de o MST se estruturar no estado.
Depois, nós tivemos algumas conquistas importantes como o Assentamento São Gregório, Assentamento Serra dos Quilombos, assim como a conquista de Camarazal, na Zona da Mata, onde houve um grande conflito e a morte de dois companheiros. Também lembro a conquista da Fazenda Safra, em Santa Maria da Boa Vista, o assentamento que daí nasceu foi um marco histórico importante.
A desapropriação e assentamento daquele que é o maior assentamento do estado, o Assentamento Catalunha, que se divide em dois municípios, Lagoa Grande e Petrolina, isso para citar alguns assentamentos que foram importantes na história do MST. E, não podemos esquecer, o Assentamento de Pedra Vermelha, em Arcoverde, que foi uma das principais ocupações feitas no estado, importante na história do MST.
Sobre os acampamentos, podemos dizer que o primeiro no Engenho Mercês, que deu origem ao MST, foi importante. Mais de 400 famílias ocuparam esta área. Em 1993, nós ocupamos a Fazenda Normandia e a conquista seguinte desse espaço é importante para a história do MST.
Nós também tivemos alguns atos importantes, que também são conquistas. Em 1994 a ocupação do Incra, com um processo de pressão política forte, conseguimos substituir o superintendente e foi uma conquista do MST que ninguém acreditava, até então o Incra tinha como superintendente um delegado de polícia. Em 1996, a greve de fome que foram 11 dias. O Centro Paulo Freire [maior espaço de formação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) no Nordeste], também é uma conquista para nós nesse processo de construção histórica.
BdF: E quais você considerou os principais desafios?
J.A.: Foram muitos desafios enfrentados pelos movimentos nesses 30 anos. O início do MST apresentou para nós um grande desafio que era a formação de militantes. Pernambuco foi um dos estados em que não havia militantes. Diferente, por exemplo, da Paraíba, Ceará e Sergipe, onde tinha uma igreja das Comunidades Eclesiais de Base, sindicatos progressistas que tinham militantes que se integraram no MST.
Aqui tinha a CPT, mas com um quadro bastante reduzido, da mesma forma a Federação dos Trabalhadores Rurais e os sindicatos.Todos os que construíram a primeira ocupação viemos de fora, nós que estávamos em Alagoas, um grupo do Espírito Santo, um grupo de Sergipe e alguns companheiros que já atuavam aqui na Paraíba. Entre eles, estavam o João Daniel, de Sergipe, que hoje é deputado federal e nos ajudou.
Nós iniciamos, ainda em 1992, o primeiro curso “Pé no Chão”, no Assentamento Serrinha, em Ribeirão, que à época, foi chamado de Curso Prolongado. A partir daí, nós distribuímos a militância do tempo-comunidade para fazer ocupações. A direção de 1993 até 1997, basicamente, era composta por companheiros e companheiras que passaram por esse tipo de formação.
Foi tão importante que nós demos continuidade a esse tipo de curso. Clodomir de Moraes foi uma referência importante em nosso processo de formação e, em 1999, nós decidimos organizar, estruturar e fundar o Centro de Formação Paulo Freire, fundado no Assentamento Normandia, em uma decisão política nossa de organizar o Centro, construir da forma como está foi, talvez, um dos maiores desafios do movimento do ponto de vista econômico, político e pedagógico.
E, até hoje, o principal curso do Centro é o “Pé no Chão”, foram 37 turmas, cada turma tem três etapas presenciais de um mês, são processos longos de formação. A grande parte da nossa militância e da nossa base participaram desse curso. A formação foi nosso principal desafio, do ponto de vista estratégico da formação política.
Um dos inúmeros desafios, para os assentamentos, foi garantir que os assentados se organizassem comunitariamente. Hoje parece uma coisa natural, mas no início até o Incra era contra fazer com que os trabalhadores organizassem cooperativas, que tivessem áreas comunitárias. O Incra era a favor de cada família ter seu pedaço, tudo separado e nós conseguimos organizar esse processo e hoje morar e organizar as agrovilas, ter ações comunitárias já é uma cultura nos assentamentos. Então os novos assentamentos nós nem discutimos mais isso, porque já é uma coisa estabelecida.
Um terceiro desafio histórico para nós foi na zona canavieira, superar a monocultura da cana, onde nós temos mais assentamentos é nessa região. O município de Água Preta é o município onde mais tem assentamentos. Nosso desafio é não produzir cana nos assentamentos. É muito difícil, infelizmente, a cultura da cana que perpassa os usineiros e acaba também os assentados levados a isso, até pela dificuldade de ter outro produto, mas nós fomos superando.
Hoje, nas nossas áreas tem muito pouco de cana plantada, nós conseguimos substituir outras culturas. O assentamento 21 de novembro é um exemplo disso, lá nós temos uma agroindústria de polpa de fruta e do ponto de vista técnico estão estudando, melhorando a produtividade. A graviola, por exemplo, tornou-se um produto importante. Fomos buscando alternativas de superar a monocultura da cana, mas ainda temos que superar a cultura escravocrata que é parte dessa cultura canavieira e temos o desafio de, com a formação, ir superando isso.
Um quarto grande desafio foi superar o analfabetismo nas nossas áreas. Isso é importante porque vai construindo dignidade. Do ponto de vista econômico, o grande desafio nosso é construir o sistema cooperativista, que nós iniciamos em 1993 fundando a primeira Cooperativa de Produção Agropecuária (CPA); em 1994, fizemos todo um trabalho organizando as cooperativas; em 1995, criamos a Cooperativa Central da Reforma Agrária que foi e é um instrumento importante e nós fomos construindo a ideia de que mais importante que a cooperativa era a cooperação agrícola e hoje isso ainda permanece como um grande desafio.
A cooperação agrícola é base fundamental e, por fim, um desafio de nós transitarmos da agricultura tradicional para a agroecologia. Esse foi o desafio dos últimos anos. Hoje, eu diria que temos outros desafios futuros, o primeiro é continuar massificando a luta pela reforma agrária, fazendo ocupações, organizando os acampamentos que já existem, apesar da conjuntura difícil que estamos vivendo de um governo fascista, mas nós vamos nos defender, defender a reforma agrária e defender o MST, porque eles querem destruir o MST como organização que luta contra o latifúndio e pela reforma agrária.
O governo Fernando Henrique, através do ministro Raul Juggman, já tentou substituir a reforma agrária por outra terminologia, na época chamavam de novo mundo rural. Não conseguiram e não vão conseguir porque o grande problema do país não são os sem-terra. O grande problema do país é o latifúndio que eles não conseguiram resolver até hoje.
Um outro desafio para nós é a questão da educação, garantir que os nossos assentados todos estejam estudando. Outro desafio está na formação política, continuar melhorando o Centro de Formação Paulo Freire. Também estamos construindo junto ao Armazém do Campo de Recife, a Escola Popular Gregório Bezerra e fazendo com que as Regionais também possam ter centros de formação, a formação político-ideológica vai nos permitir que essa nova geração militante tenha melhor capacidade para fazer análise de conjuntura, interpretar a realidade e propor.
Eu diria que outro desafio é a questão da comunicação, nós temos que melhorar nossa comunicação interna e também com a sociedade. Nós temos o desafio interno da produção, da agroecologia e para comercialização que é importante, porque são os alimentos frutos de 30 anos de luta, aí também entram os Armazéns do Campo como tarefa importante, de ser a nossa cara pública e nós vamos ter Armazéns do Campo, nos próximos anos, em todas as cidades, disseminando a ideia de que se alimentar é um ato político e nós temos que convencer a sociedade disso
BdF: Quais as alianças que possibilitaram essa trajetória de 30 anos?
J.A.: Primeiro, o movimento fazia uma análise inicial em função da cultura, do povo pernambucano lutar pela sua história. Aqui surgiram movimentos importantes, como a luta contra a escravização do trabalho negro, com mais de 300 anos de luta, com os principais quilombos organizados aqui.
Porque Alagoas antes era território de Pernambuco; a luta contra a invasão holandesa desperta como um processo de resistência que vai construindo uma cultura; no início do século passado tivemos toda a história do cangaço no sertão, que foi importante na questão da luta contra o latifúndio, da luta contra os coronéis, e Virgulino Ferreira e Maria Bonita foram muito importantes nesse processo de resistência, de luta do povo sertanejo.
A Revolução Pernambucana deixa um lastro histórico, mais recente tiveram as Ligas Camponesas, que foram um processo de luta importante dos camponeses na época em que Miguel Arraes governava o estado [Arraes foi destituído e preso com o Golpe de 1964]. Lembrando que a luta contra a ditadura militar, volta e meia se fala que a primeira greve contra a ditadura foi no ABC Paulista, mas as primeiras grandes greves contra a ditadura que foram massivas foram as greves canavieiras entre 1977 e 1978, que pararam o campo de Pernambuco, Alagoas e parte da Paraíba.
Havia um medo muito grande de que o MST fosse radicalizar o campo, como fizeram as Ligas Camponesas e nós ficamos completamente isolados após a primeira ocupação. A Fetape [Federação dos Trabalhadores Ruais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado de Pernambuco], nós não conhecíamos muito; o Partido dos Trabalhadores ficou olhando de lado, os principais dirigentes observando, com medo que pudesse dar errado e que o partido caísse com o processo; o grupo do governador Miguel Arraes foi contra a ocupação, porque achava que não podia ser quebrada a hegemonia da Fetape; a CPT praticamente estava mais forte no Sertão do Pajeú, onde nós ainda não havíamos chegado; então nós tivemos que reconstruir tudo com muita luta e foi muito duro.
A primeira acolhida que nós tivemos, solidária, no sentido de construir alianças foi com a Paróquia de Cabrobó. Nós fomos de Cabo de Santo Agostinho para fazer uma ocupação em Cabrobó e lá fomos recebidos, de forma muito importante pela igreja e pelos que organizavam as Comunidades Eclesiais de Base, que hoje são quadros políticos, eles foram muito importantes na recepção, no apoio, colocaram a sede o PT de Cabrobó e a sede da Paróquia a nosso serviço; montamos lá um alojamento para atender o acampamento e eles garantiram a estrutura de carro e gasolina para organizar a ocupação na Fazenda Varginha, que era muito distante da sede da cidade.
Com o apoio deles, nós fizemos uma segunda aliança muito importante, que foi com o dr. Adão, que era juiz da 8ª Vara de Petrolina e se colocou como apoio ao MST porque ele viu que o MST era a única organização que poderia fazer uma luta importante pela expropriação das áreas do escândalo da mandioca. Se nós ocupávamos as áreas, ele fazia os processos. Isso foi importante para nós, essa aliança com o Ministério Público e a Justiça Federal naquele momento em específico, tanto que a Fazenda Papagaio homenageia um importante lutador nessa luta do escândalo da mandioca, tem todo um processo em que fomos construindo mais alianças.
A CPT veio logo depois, com a Marluce, que hoje está na CPT, e foi mais do que uma apoiadora, foi uma integrante do MST e sempre atenta, nos apoiando no que era possível. Algumas alianças são importantes destacar. Quando nós fizemos a ocupação em Arcoverde, nós tivemos o Julião Guerra, que era prefeito de Arcoverde e nos deu todo o apoio, participou da ocupação; o Israel Guerra que era deputado participou ativamente, foram alianças importantes.
Com a ocupação em Normandia nós fomos construindo um outro processo, porque Normandia passou a ser referência, e aí nós construímos com o deputado Jorge Gomes, com a igreja de Caruaru o Padre Pedro, que hoje não está entre nós, o Tom Costa, que foi importante nessa construção e nós fomos ampliando.
Na Mata Norte, com a violência sofrida principalmente no Massacre de Camarazal, que levou o movimento para a sociedade e a greve de fome de 1996, que selou essa articulação com o Recife. Fomos construindo alianças importantes com o sindicatos, com a CUT, o Sindsprev, que foi muito importante na época, nos deu guarida, foi importante pra nossa articulação e alguns companheiros deputados, além do Israel Guerra, que foi importante nessa caminhada nossa, tem também o João Paulo, Humberto Costa [ambos do PT].
É importante citar nessa questão a nossa relação com Mirandiba. Mirandiba participou ativamente das ocupações no Sertão do São Francisco e na época o prefeito foi essencial para que a gente pudesse construir. O Nelson Pereira depois se elege deputado estadual, foi um articulador tanto lá em Mirandiba quanto no sertão. Foi um prefeito que articulou várias tecnologias e para nós é importante fazer essa referência. Esse talvez seja o grande desafio nosso: a relação com a sociedade, a articulação política pra frente.
Hoje, sem falsa modéstia, o movimento construiu alianças consolidadas e sólidas. A resistência no Centro de Formação Paulo Freire foi isso: a sociedade entendendo a importância do centro, do MST e da luta pela reforma agrária. Se nós não tivéssemos essas alianças consolidadas, nós seriamos crucificados e derrotados aqui em Normandia e nós vencemos. A partir da próxima semana, vamos anunciar que chegamos a uma solução e o Centro vai sair vitorioso desse processo.
Não só o centro, mas o movimento no seu conjunto, nossos aliados e a classe trabalhadora sai vitoriosa nesse processo de resistência. Eu diria que o que ocorreu no mês de resistência em Normandia é resultado desse processo histórico de aliança com a sociedade, com o sindicalismo, com os partidos de esquerda, com prefeitos, vereadores, fomos construindo esse processo importante e que é um desafio.
A partir de alguns instrumentos é que vamos construindo juntamente com os outros, como a editora Expressão Popular, que vende muito aqui no estado e estudantes e professores tem como uma referência desse campo intelectual e teórico, o Brasil de Fato, que o movimento tem uma participação importante nisso e nós vamos fortalecendo cada dia, tanto online quanto impresso, que é uma forma de comunicação para nossa relação com a sociedade.
Claro que cada momento histórico fomos construindo outras alianças. Hoje temos uma aliança que foi consolidada com setores da igreja católica, das igrejas evangélicas, como a Batista do Brasil, que foi importante pra nós em 1997 até os anos 2000. Acredito que, com os Armazéns do Campo, vamos fortalecer mais alianças em nível tanto estadual quanto nacional, mas também as alianças locais nos municípios.
BdF: Como o MST tem avaliado e reagido ao avanço da direita, sobretudo, no governo federal?
J. A.: A conjuntura política hoje para luta pela Reforma Agrária é muito difícil porque os que estão no governo são a favor do latifúndio e defendem abertamente a estrutura agrária brasileira da forma como está. São a favor da propriedade privada, contra qualquer tipo de ocupação e se pudessem faziam uma ação de limpar o campo utilizando todo tipo de violência para impedir a organização e destruir todos os acampamentos e assentamentos. Nós vamos enfrentar isso. Eles estão trabalhando com a ideia de ir nos derrotando aos poucos, esvaziando os acampamentos e esvaziando os assentamentos através da titulação, que nada mais é que uma tentativa de privatizar os assentamentos e isso é muito perigoso.
Momentos difíceis nós sempre passamos. Nesses 30 anos, nós passamos pelo governo Sarney, onde no campo os fazendeiros construíram a UDR [União Democrática Ruralista] e nós vencemos. Depois, enfrentamos o governo de Fernando Collor, onde os latifundiários e o presidente vieram para cima com muito ódio, contra a reforma agrária e a favor do latifúndio. Ainda havia uma ausência de legislação, pois as lei aprovadas na Constituinte ainda não haviam sido regulamentadas.
A partir de 1994, enfrentamos o neoliberalismo onde não existe mais espaço para pequena agricultura e para reforma agrária, porque o grande negócio é articulação internacional, abertura total de mercados, só tinha espaço no neoliberalismo para aqueles que tinham capacidade de disputar o mercado e nós o enfrentamos com muita luta.
Enfrentamos uma seca de 1997 a 1999 no Nordeste, foram realizados saques no sertão inteiro para garantir que o governo criasse uma política de apoio aos trabalhadores; enfrentamos o massacre de Eldorado dos Carajás, de Corumbiara e vários companheiros e companheiras que foram assassinados.
Também tivemos que enfrentar o governo Lula e Dilma, que foram governos muito difíceis, porque havia a ideia que o governo agora ia fazer a reforma agrária e era aliado do movimento e da classe trabalhadora. A análise era correta, mas do ponto de vista de enfrentar o latifúndio as alianças feitas não permitiram que o governo fizesse isso e nós ficamos no meio do caminho, em uma posição perigosa porque, se nós criticássemos o governo, nos taxavam de ser anti-Lula e anti-governo e, se nós apoiássemos o governo, a direita dizia que nós tínhamos deixado de ser movimento social para ser governo.
Mas aproveitamos algumas políticas que foram importantes nesse período e a luta pela reforma agrária, apesar da violência e da tentativa de criminalização. A imprensa nos maltratou muito, nos governos de Fernando Henrique e também no governo Lula, a batalha com a imprensa comercial foi longa. Agora estamos enfrentando o fascismo e eu acho que nós vamos vencer porque o governo passa e o movimento continua. A nossa tarefa nesse momento é resistir como movimento e nos fortalecer e aos nossos acampamentos e assentamentos.
Fonte: Brasil de Fato