"Trabalho Médico e Não Biopirataria": Dr. Hilton Pereira da Silva
"Como cidadão brasileiro, como profissional de saúde, e como pesquisador é meu dever proteger as pessoas que colaboram em meu trabalho, e resguardar-lhes os interesses. Esta tem sido a minha postura em mais de uma década de trabalho entre os grupos rurais da Amazônia"
Sr. Diretor/Redator
Biodiversidad en América Latina
gro.aldadisrevidoib@ofni
22 de abril de 2005
Venho solicitar a esta publicacao a garantia de Direito de Resposta visto que minha honestidade e honra foi atingida pela matéria "Empresa vende DNA de Índios da Amazônia" publicada em 14 de abril. A fim de esclarecer os fatos solicito que este informativo publique, na íntegra, a carta que segue em anexo a este (copiada tambem ao final desta mensagem).
Caso este informativo não cumpra o dever de garantir a resposta, sob qualquer pretexto, peço que me comunique no prazo máximo de cinco dias, ao fim dos quais entenderei a omissão como negativa e tomarei as atitudes legais cabíveis para a defesa de minha boa honra.
Prof. Dr. Hilton Pereira da Silva
Professor Adjunto II de Antropologia e Medicina
Chefe do Departamento de Antropologia
Coordenador do Setor de Antropologia Biológica
Diretor do Laboratório de Estudos Bioantropológicos em Saúde e Meio Ambiente
Departamento de Antropologia
Museu Nacional
Universidade Federal do Rio de Janeiro
Quinta da Boa Vista s/n
20940-040, Rio de Janeiro, RJ Brasil
rb.jrfu.dca@avlisadh / Fone (21) 3860-7170
Trabalho Médico e Não Biopirataria
Na reportagem “Empresa vende DNA de Índios da Amazônia” publicada online, em 14 de abril deste ano o meu nome e o de minha ex-esposa são ligados a atos de biopirataria, sem que nós jamais tenhamos sido ouvidos por este jornal. Esta reportagem refere-se a um inquérito sobre a venda de células sanguineas dos índios Karitiana e Suruí, pelo laboratório Norte americano Coriel Cell Repositóries.
Em agosto de 1996, trabalhei entre os Karitiana em um documentário para o Canal Discovery e, após constatar sua precária situação de saúde, fui convidado pelo Chefe Garcia Karitiana, em nome da Associação Karitiana, para ficar na aldeia e os ajudar com atendimento médico emergencial e exames. Com o propósito de estabelecer o diagnóstico de algumas doenças, amostras de sangue foram colhidas e levadas para análise na Universidade Federal do Pará, onde todo o material coletado permaneceu depositado até ser solicitado pela justiça de Rondônia. O sangue por mim coletado não saiu do Brasil e não teve, em hipótese alguma, destino comercial, visto ser isto contra a minha ética e os princípios morais dos pesquisadores e instituições com os quais trabalho. Eu, com a colaboração de minha ex-esposa Denise, que é brasileira, atendi aos Karitiana em caráter voluntário e humanitário, emergencial, e não lhes fiz qualquer promessa de atendimento futuro. Os relatórios de minhas atividades médicas emergenciais na aldeia foram enviados à Associação Karitiana, à Funai de Rondônia e de Brasília, e ao CIMI de Rondônia. Eu jamais estive entre os Suruí.
Uma simples pesquisa na internet, mostra que o material a venda nos EUA provém da coleção Stanford/Yale, e foi coletado na década de 1980 por pesquisadores Norte-americanos, possivelmente com a permissão da Funai, e já estava sendo vendido, via web, desde o início de 1996, portanto, antes de eu ir até a Aldeia. Em fevereiro de 1997 eu e outros pesquisadores, iniciamos contatos com o laboratório para que se pronunciasse sobre o assunto e conversamos com autoridades brasileiras para solicitar o repatriamento do material. Nossas solicitações de contato foram ignoradas. Desde 1997 diversos artigos têm sido publicados em jornais apresentando de forma distorcida os fatos, insinuando minha participação em atos de biopirataria, ao invés de resgatar os esforços feitos por mim e outros pesquisadores para proteger os direitos dos Karitiana. Eu tenho respondido a todos artigos dos quais tenho conhecimento, porém os erros grosseiros continuam a ser publicados.
A biopirataria é uma questão a ser seriamente investigada pelas autoridades brasileiras, pela comunidade científica e pela imprensa. O uso comercial de produtos biológicos sem que seus doadores sejam beneficiados é absolutamente imoral, antiético, e deve ser repudiado por toda a sociedade. Como cidadão brasileiro, como profissional de saúde, e como pesquisador é meu dever proteger as pessoas que colaboram em meu trabalho, e resguardar-lhes os interesses. Esta tem sido a minha postura em mais de uma década de trabalho entre os grupos rurais da Amazônia. Tenho me colocado sempre a disposição de jornalistas e autoridades para prestar quaisquer esclarecimentos sobre o lamentável envolvimento do meu nome nesta esdrúxula situação, onde sou acusado de atos bárbaros apenas por atender a um chamado emergencial de uma tribo em necessidade e cumprir os preceitos do Código Brasileiro de Ética Médica. É uma pena que no Brasil ainda se continue dando mais valor ao sensacionalismo que aos fatos.
Prof. Dr. Hilton Pereira da Silva, Departamento de Antropologia, Museu Nacional/UFRJ. ( rb.jrfu.dca@avlisadh).