Não há espaço no Brasil para a semente da empresa Bayer
A audiência pública sobre o arroz transgênico realizada esta semana em Brasília deixou claro que não há espaço no Brasil para a semente da empresa Bayer. Embrapa, Farsul, Irga e Federarroz se posicionaram oficialmente contrárias à liberação da variedade modificada para tolerar aplicações do herbicida glufosinato de amônio, também da Bayer.
Os motivos apresentados foram técnicos e econômicos. Flávio Breseghello, do centro de pesquisa em arroz e feijão da Embrapa, levou à audiência a posição da Empresa “autorizada pela presidência”. O pesquisador frisou que a empresa não é contra os trangênicos (pelo contrário, faz pesquisas na área) e nem contra a modificação genética do arroz, mas que neste caso o produto da Bayer “agravará os problemas já existentes”. “Não devemos usar tecnologias que terão validade de poucas safras”, disse Breseghello.
O principal entrave técnico enfrentado pelos produtores de arroz é o controle do arroz vermelho, espécie ancestral do arroz comercial, que compete com a cultura. A preocupação é a constatação de que a planta transgênica inevitavelmente cruzaria com sua parente vermelha e daria origem ao arroz vermelho transgênico resistente a herbicida. Também foi exposto durante a audiência que o arroz vermelho, pelas características que apresenta de planta não domesticada, produz sementes com dormência (que ficam armazenadas no solo por anos à espera de condições propícias para germinar).
Também falou-se da tecnologia chamada de ClearField, da também alemã Basf. A semente desse tipo de arroz tem sua genética modificada por meio de mutações induzidas. O resultado é uma planta resistente ao herbicida Only (do grupo das Imidazolinonas), produzido pela Basf.
O produtor gaúcho e engenheiro agrônomo Cláudio Escosteguy, de Santana do Livramento, apresentou fotos de lavouras de arroz ClearField nas quais o veneno aplicado já não controla mais o arroz vermelho. A vida útil da tecnologia não passa de 3 anos. Em compensação, deixa para trás arroz vermelho que incorporou a resistência ao produto e que ninguém sabe como controlar.
Breseghello foi enfático ao afirmar que “a contaminação é irreversível”, destacando que as áreas que apresentam problemas com a tecnologia ClearField são justamente as mais propensas a adotar o arroz transgênico da Bayer. 70% das amostras de arroz vermelho colhidas em 2007 no Rio Grande do Sul apresentaram resistência ao Only. Como arroz vermelho e cultivado crescem juntos nas mesmas áreas, a combinação daria origem a plantas de arroz vermelho resistentes a dois tipos diferentes de herbicidas. “Não há como fazer recall” [da contaminação]”, completou o pesquisador da Embrapa. “O Rio Grande do Sul produz 70% do arroz brasileiro. Trata-se, portanto, de uma questão de segurança alimentar”, acrescentou.
Os produtores de arroz manifestaram forte preocupação do ponto de vista comercial. Receiam perder mercado interno e externo com a eventual liberação da variedade transgênica. “Considerando que não existe consumo corrente nem mercado global para o arroz transgênico, concluímos que a entidade não é favorável nesse momento à liberação”, disse Renato Caiaffo Rocha, em nome dos produtores reunidos na Farsul e na Federarroz e do Instituto Rio Grandense do Arroz - Irga.
As críticas disparadas pela maioria dos palestrantes da audiência parecem ter incomodado o presidente da CTNBio, que em dado momento demonstrou certa indignação pelo fato de serem feitas tantas cobranças em relação ao arroz transgênico, uma vez que produto mutagênico da Basf foi liberado sem passar pela sabatina. No dia seguinte, durante a reunião plenária da CTNBio, Colli afirmou que cabe à Comissão avaliar os aspectos de biossegurança do arroz e que se os produtores perderem mercado “o problema é deles”.
João Batista Volkman, produtor e engenheiro agrônomo, expôs durante a audiência que colhe 8 toneladas de arroz por hectare com base nos métodos da agricultura biodinâmica, sem usar nenhum agroquímico. A média da produtividade do arroz no Rio Grande do Sul, estado de Volkman, gira entre 6 e 7 toneladas. O produtor levantou a questão da contaminação: “quem se responsabilizará caso meu arroz seja contaminado e eu perca meus selos de qualidade orgânica e biodinâmica?”
Para se ter uma idéia dos estudos apresentados pela Bayer à CTNBio, um dos que pretende comprovar a segurança alimentar do produto foi feito com frangos. O auditório não conteve os risos quando perguntaram ao representante da Bayer porque usar frangos nos testes se estes não se alimentam de arroz.
Sarah Agapito, do Programa de Recursos Genéticos Vegetais da Universidade Federal de Santa Catarina, apresentou uma crítica aos dados da Bayer sobre a descrição molecular da modificação genética promovida no arroz. Há análises apresentadas que se baseiam na amostragem de uma única planta. “Ora, amostragem de uma planta só não é amostragem, disse Agapito”. Segundo ela, é explícita a falta de rigor científico, e os estudos não seriam aceitos para publicação por nenhuma revista científica. Algumas afirmações foram feitas sem as devidas análises laboratoriais que poderiam comprová-las, como por exemplo o número de cópias do transgene inseridos na planta, que a Bayer afirma ser apenas um, conforme previsto na teoria. Sarah também informou que a modificação genética acarretou na deleção de um nucleotídeo (que formará os aminoácidos, que formarão proteínas - saindo um da seqüência pode-se obter diferentes combinações de aminoácidos e de proteínas, por conseqüência) e que o fato não é citado pela empresa. O representante da Bayer, presidente da comissão interna de biossegurança da empresa, não soube explicar o porquê de tamanho “desencontro” de informações.
Outras exposições reforçaram a ausência de dados ambientais e de saúde gerados no Brasil que possam subsidiar a tomada de decisão pela CTNBio.
O presidente da CTNBio anunciou que aguarda os pareceres a serem elaborados por membros da Comissão e a análise dos dados apresentados durante a audiência. Toda a sociedade deve fiscalizar a decisão da CTNBio. Será um grande escândalo caso esta dê sinal verde ao arroz transgênico.
Algodão
Nesta quinta-feira, por 15 votos, a 5 a CTNBio aprovou a comercialização de mais uma variedade de algodão transgênico, o Bt chamado de widestrike. Desta vez a empresa beneficiada foi a DOW, que como mostra matéria abaixo está para ser comprada por DuPont, Syngenta ou Bayer.
Campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos
Boletim Número 434 - 20 de março de 2009
AS-PTA