MST em diálogo com o Governo: Negociações para uma Reforma Agrária Popular

Idioma Portugués
País Brasil
Conversas giram em torno do futuro da Reforma Agrária Popular. Foto: Juliana Adriano

Em entrevista, Diego Moreira, do setor de produção do MST, traz perspectivas da Jornada Nacional Por Terra e Comida de Verdade para o Povo e de reuniões com o Governo

Por Fernanda Alcântara
Da Página do MST

Nas últimas semanas, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) realizou uma jornada de lutas pela reforma agrária e pela garantia de direitos para os trabalhadores do campo. Em meio às dificuldades sociais enfrentadas pela maioria do povo brasileiro, o MST se reuniu com representantes do governo federal para apresentar suas demandas e propostas para o desenvolvimento rural sustentável e a da soberania alimentar.

Um dos pontos do início destas conversas foi o Caderno de Respostas ao MST, apresentado durante as celebrações do Dia Mundial da Alimentação. Em parceria com a FAO/ONU, o documento destaca a persistência da fome em nível global e no Brasil, ressaltando as ações do Governo Federal para combater a insegurança alimentar. A iniciativa compartilhada entre a Secretaria-Geral da Presidência e ministérios relacionados responde às demandas do MST, concentrando-se em questões como agricultura familiar, reforma agrária, educação no campo, inclusão social e desenvolvimento sustentável.

O texto realça os avanços na reforma agrária, educação no campo e produção de alimentos saudáveis, ao mesmo tempo em que salienta os desafios enfrentados pelas famílias acampadas, a contaminação por agrotóxicos e os desequilíbrios ambientais. A busca por vida digna no campo, justiça social, alimentos saudáveis e políticas públicas com a participação social, em colaboração com outros movimentos sociais, também é destaque no documento (confira e baixe o documento abaixo).

Além do documento, em três reuniões consecutivas o MST dialogou com ministros de diferentes áreas, buscando soluções para os problemas que afetam os camponeses e a sociedade brasileira. As reuniões foram fruto da mobilização nacional do MST, que realizou diversas ações em todo o país com atividades pedagógicas, ações e atos públicos, denunciando o descaso da reforma agrária e exigindo políticas públicas para o campo.

Na noite de segunda-feira (16), o MST se reuniu com a Ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, em Brasília. As discussões se concentraram no orçamento para a retomada da reforma agrária. O Movimento destacou a urgência do assentamento imediato de todas as famílias acampadas no país, a necessidade de recursos para promover políticas de incentivo à produção de alimentos saudáveis e a importância de retomar o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), assegurando recursos públicos para essa finalidade.

Foto: Comunicação MST

Na terça-feira (17), o MST se reuniu com os Ministros Rui Costa, da Casa Civil, Márcio Macedo, da Secretaria-Geral da Presidência, e Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, em Brasília. As discussões envolveram as reivindicações em torno do assentamento das 65 mil famílias acampadas, o estímulo à produção de alimentos saudáveis e o combate ao analfabetismo nas áreas de reforma agrária. Rui Costa enfatizou a importância do alinhamento da proposta de alfabetização do MST com as prioridades do governo Lula e a necessidade de recursos para combater o analfabetismo.

Já na quarta-feira (18), o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, recebeu a direção nacional do MST em Brasília, DF. Haddad enfatizou a necessidade de criar condições para fortalecer políticas públicas relacionadas à reforma agrária e ao assentamento de famílias acampadas. O MST destacou a urgência de um orçamento adequado para a reforma agrária.

Reunião do MST com os Ministros Paulo Teixeira (MDA) e Fernando Haddad (Fazenda) ocorreu na quarta-feira (18). Foto: Diogo Zacarias

Essas reuniões significam a mobilização do MST na lutar não somente pela terra, mas também por um projeto de sociedade que valorize os trabalhadores/as rurais e urbanos, que respeite o meio ambiente e que garanta a segurança alimentar da população.

E na defesa da democracia, a justiça social e a soberania nacional dessa Jornada Nacional de Lutas, confira a entrevista com Diego Moreira, do setor de produção do MST. Presente nas reuniões, Diego explica quais os desafios e conquistas do movimento na produção de alimentos agroecológicos, na organização das cooperativas e na construção de uma nova cultura no campo.

Quais são os principais pontos positivos nas respostas do Governo Federal em relação às demandas apresentadas pelo MST? Quais avanços específicos foram destacados?

Primeiro, nós gostaríamos de reconhecer e valorizar o esforço do governo em receber a pauta e procurar, em alguma medida, dar um retorno a essa pauta. Essa consideração, esse respeito para com os movimentos sociais é fruto dessa retomada da democracia no país, retomada de um governo que tem responsabilidade social. Então, gostaríamos de registrar essa postura que tem que ser valorizada.

Achamos que houve pontos importantes de avanço, como é o caso da suplementação orçamentária para o PPA, que é um programa significativo de abastecimento no combate à fome, e a retomada da equipe pedagógica do Pronatec, que é o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária, de extrema relevância. Embora ainda seja necessário melhorar, já ocorreram avanços consideráveis, e o compromisso do governo em assentar as famílias acampadas é compartilhado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, pelo Incra e por todo o governo, que se empenha em uma agenda robusta para o assentamento das 65 mil famílias acampadas no Brasil. Portanto, consideramos essas questões como positivas e que devem ser trabalhadas a partir de agora.

Familias Sem Terra em trabalho cooperado. Foto: Wellington Lenon/MST no PR

O texto menciona a persistência da fome, tanto em nível mundial quanto no Brasil. Como o MST avalia as medidas propostas pelo Governo para combater a insegurança alimentar? Elas são suficientes?

Em relação ao tema da fome, realmente continuamos muito preocupados com a situação da população brasileira que ainda enfrenta extrema miséria e fome, um problema que precisa ser resolvido e que não é só do Brasil, sendo um problema mundial. Portanto, é essencial que o governo estabeleça uma política nacional de abastecimento. O governo brasileiro, assim como o Estado brasileiro, deve garantir que nosso povo tenha condições mínimas e dignas para se alimentar, sem depender de políticas para exercer esse direito.

É importante que o governo brasileiro, sensível a essa questão, una esforços para desenvolver um programa nacional de abastecimento que promova a soberania e a segurança alimentar, fortalecendo a Conab [Companhia Nacional de Abastecimento] com recursos, estrutura e funcionários, e subsidiando os produtores, especialmente os assentados e agricultores familiares que desempenham um papel fundamental na produção de alimentos no Brasil. Dessa forma, podemos garantir que os alimentos produzidos cheguem à população que mais precisa.

O Caderno de Respostas e as reuniões que se seguiram esta semana destacam a importância da colaboração com a sociedade civil, especialmente os movimentos populares do campo. Como o MST vê essa cooperação e quais são as expectativas em relação a políticas públicas futuras?

Cerimônia para entrega do Caderno de Respostas do MST. Foto: Juliana Adriano

Entendemos que o Caderno de Respostas é uma metodologia de diálogo do governo com as demandas dos movimentos sociais e do movimento popular, o que torna ele uma importante ferramenta para que o governo possa considerar e responder a cada ponto específico, seja de ministérios, autarquias ou áreas relacionadas.

Portanto, consideramos o Caderno de Respostas uma metodologia valiosa. No entanto, após o seu recebimento é necessário analisar minuciosamente cada ponto. Por exemplo, no que diz respeito à questão da terra é preciso estabelecer um cronograma e um plano de trabalho para assentar as 65 mil famílias acampadas. No que se refere ao desenvolvimento dos assentamentos, quais ações o governo planeja executar por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)? Que políticas públicas serão implementadas para assegurar o desenvolvimento dos assentamentos, abrangendo infraestrutura básica, habitação, energia renovável, escolas do campo, agroindústrias, assistência técnica? Ou seja, são várias medidas necessárias para garantir que as pessoas que vivem nos assentamentos possam produzir e levar uma vida digna no campo.

Quais são os principais desafios para o MST que ainda precisam ser abordados, especialmente em relação aos acampados, à contaminação por agrotóxicos e aos desequilíbrios ambientais? Como o MST planeja abordar essas questões em colaboração com o Governo Federal daqui em diante?

Acreditamos que precisamos avançar em um pacto nacional em defesa da agricultura brasileira e da biodiversidade do país. Então, acreditamos que os movimentos populares, em especial os movimentos pela reforma agrária, a sociedade brasileira e o setor produtivo do Brasil precisam construir uma agenda considerando os impactos ambientais. Que ações tomaremos para minimizar os efeitos das mudanças climáticas? Que ações em defesa da biodiversidade brasileira e na produção de alimentos para estabelecer um programa nacional de abastecimento e resolver o problema da fome no país? Esta é uma agenda conjunta que precisamos abordar, e pedimos que a sociedade nos apoie nisso.

Destacamos dois pontos principais. O primeiro é a criação de um programa nacional de abastecimento e a questão ambiental, em que devemos fortalecer programas de proteção ambiental para garantir uma produção mais sustentável e fornecer alimentos de qualidade para quem mais precisa. No segundo aspecto, precisamos de um plano emergencial para assentar 65 mil famílias acampadas e chegar a 200 mil até o final do governo de Lula. E isso requer uma ação imediata, e devemos unir esforços para alcançar esse objetivo, além de garantir que o governo reduza os subsídios, especialmente para agrotóxicos, que são responsáveis pela grande contaminação e desequilíbrio ambiental.

Portanto, esses dois esforços mostram que é essencial considerar a possibilidade de taxar o uso de agrotóxicos, aumentando ainda mais os impostos sobre aqueles que os utilizam de forma indiscriminada e contendo a liberação de novos agrotóxicos no Congresso Nacional, enquanto isentamos os agricultores que adotam práticas regenerativas e em comunhão com o meio ambiente. Precisamos desenvolver políticas nessa direção.

Marmitas da Terra foram distribuídas a todas as pessoas participantes da mobilização. Foto: Juliana Barbosa/MST no PR

O MST mantém o compromisso de defender a democracia, pois entendemos que a reforma agrária é parte da consolidação da democracia. Defendemos o governo legítimo de Lula, que foi eleito de forma justa, para governar legitimamente. Nossa defesa inclui questões fundamentais que afetam o povo brasileiro, como emprego, alimentação e a preservação do meio ambiente. Continuaremos dialogando com a sociedade por meio de nossas ações, lutas e programas, em colaboração com o governo e a sociedade.

*Editado por Solange Engelmann

Fuente: MST

Temas: Agricultura campesina y prácticas tradicionales

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