Festa da Semente Crioula cultiva os valores da terra
O nome deu o tom e as cores da diversidade contrastavam com o verde predominante no horizonte do campo. Foi na linha Tesoura, no interior do município de Seberi, que centenas de trabalhadores rurais se encontraram para mais uma Festa da Semente Crioula promovida pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) com o apoio da Cooperbio neste sábado, 2 de fevereiro.
Tradicional evento promovido pelo MPA ocorreu neste sábado, em Seberi
Vindos de vários lugares, inclusive de fora do país, eles se reúnem para trocar grãos, consumirem alimentos saudáveis, adquirirem produtos agroecológicos, mostrarem um pouco do seu trabalho e se divertirem ao som de canções embaladas pela gaita.
Normélio Triaca, 72 anos, percorreu 65 quilômetros de Palmitos (SC), onde reside, para vir ao Norte do Rio Grande do Sul participar. Em meio a seus brinquedos artesanais feitos com a união da criatividade, um pouco de cola, madeira, trabalho manual e milho, exibe orgulhoso o certificado de segundo lugar no Brasil como mantenedor de sementes crioulas obtido por ele e a esposa, além do título de guardião da agrobiodiversidade. “Para mim é uma honra manter a tradição. A produção do artesanato começou quando fiz carrinhos de milho para a Festa da Polenta na linha da Gruta, em Palmitos. Um guri me pediu um caminhão e o plantou com a ideia de que iriam nascer caminhõezinhos. Depois daí continuei”, contou Triaca, que além de veículos, fabricou uma pequena réplica de uma máquina de moer grãos chamada monjolo e uma miniatura de si mesmo.
Juventude no movimento por alimentos naturais
A juventude também atua na produção de alimentos com uso de práticas que visam à preservação do ambiente.
Na 5ª Festa da Semente Crioula, Fernanda Mielniczuk de Moura Silveira, 21 anos, Mel Gomes, 18 anos, e Franklin Sales de Oliveira, 19 anos, os três membros do MPA, ficaram na seção de remédios feitos com plantas e substâncias naturais na feira agroecológica, onde puderam compartilhar seus conhecimentos. “Tenho aprendido muita coisa que não sabia antes e comecei a ver o mundo dum jeito diferente. Em uma formação que tivemos essa semana, conhecemos até um pouco da história da humanidade, os 90 mil anos antes das sociedades de classe e que a diferença entre seres humanos não é natural. Se a gente continuar do jeito que está, pessoas vão continuar sendo exploradas no capitalismo, o mundo vai se destruir e logo teremos a última geração da Terra. Estou gostando da festa, é bom conversar com tanta gente diferente”, comentou Fernanda. Vinda de Porto Alegre, teve na figura da avó um exemplo de dedicação ao plantio de alimentos e flores sem aplicação de veneno que deseja seguir.
De longe para cultivar os valores da terra
Coordenador regional do MPA no Litoral gaúcho, Paulo Boff produz e vende maracujás e bananas orgânicas. Para ele, permanecer no campo e produzir o próprio alimento é garantia de saber as origens do que se põe à mesa. “É ser dono do seu nariz, hoje o agricultor tem liberdade. Tem seus compromissos, serviços, mas tem a possibilidade de estar numa festa como essa hoje, porque é autônomo. A saída para o produtor é a diversidade, principalmente na subsistência, para não ficar dependente do mercado e das multinacionais de sementes e agrotóxicos”, comentou Boff, que veio em um grupo de 11 pessoas e percorreu 630 quilômetros para estar presente no evento após sair de Mampituba.
Vindo da mesma cidade, Valdemir Callegari de Mello, 35 anos, planta bananas, uvas, pêssegos e ameixas. Até tentou ser caminhoneiro por gostar da estrada, mas fixou raízes na agricultura, onde a vida é mais tranquila. “Viajava até três dias a fio e não sabia o que era dormir, não tinha horário para nada. Na agricultura, trabalhamos no sol, mas sabemos que teremos um descanso bom. Recebi o convite e vim para cá, está sendo ótimo”, complementou.
A Festa da Semente Crioula ainda contou com atividades de formação, missa, almoço típico camponês e rodadas de conversa.
Fonte: Folha do Noroeste