Conflitos nas áreas de expansão da produção de agroenergia no Brasil
Na semana do Dia Internacional da Mulher, semana de luta dos movimentos sociais contra as monoculturas e o agronegócio, a mesma escolhida pelo Presidente Bush para tratar do tema da agroenergia no Brasil, organizações integrantes do Grupo de Trabalho Energia do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (GTEnergia do FBOMS) lançam estudo sobre os impactos locais nas áreas de expansão de produção de etanol e biodiesel do sudeste e centro-oeste brasileiro
O estudo, desenvolvido pelos pesquisadores Wendell Ficher Assis e Marcos Cristiano Zucarelli, mestres em sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), apresenta uma análise de campo do que está acontecendo hoje nas áreas de expansão dos combustíveis chamados "verdes". Na realização da pesquisa foram percorridos cerca de oito mil quilômetros de cinco estados brasileiros e constatado que o avanço de monocultivos energéticos acirra os conflitos relacionados a destinação de terras para a reforma agrária, a demarcação de terras indígenas e a competição com a produção de alimentos.
Para Zucarelli, as entrevistas com vários atores sociais possibilitaram identificar uma relação direta entre a expansão de cultivos energéticos e o aumento dos conflitos socioambientais. Segundo o pesquisador "a expansão propicia a concentração de terras, expulsa o homem do campo, ao mesmo tempo que pressiona biomas preservados, como regiões do Cerrado e da Amazônia".
Conforme Lucia Ortiz, coordenadora da ONG Amigos da Terra Brasil, os resultados do estudo se somam aos alertas sobre a falsa solução que representa o comércio internacional de biocombustíveis no combate às mudanças climáticas com justiça social e ambiental e "traz um retrato fiel do que as pessoas estão passando no campo com esta onda de expansão do agronegócio a serviço de uma economia que privilegia os automóveis e não as pessoas", enfatiza.
O estudo traz também exemplos de sustentabilidade e gestão democrática dos recursos energéticos, apresentando uma perspectiva de descentralização da produção e consumo, que possibilita a diversificação da produção rural e a permanência da agricultura familiar no campo. Para o membro da coordenação do GTEnergia, Wendell Assis, "estes exemplos desafiam uma lógica hegemônica que perpetua o Brasil como exportador de commodities agrícolas produzidas em larga escala".
Confira abaixo alguns depoimentos marcantes no estudo:
A gente aqui vai ficando exprimido. Tem gente que pensa diferente, tem sentimento pela terra, aí num arrenda pra cana, mas outros num agüenta e acaba cedendo. Eu tô ficando cercado pela cana (Entrevista com P.pequeno produtor rural – Uberaba/MG, 26/11/2006).Os tradicionais criadores aqui da região do triângulo estão arrendando ou vendendo as terras pra cana e indo criar gado em Tocantins, Rondônia e Mato Grosso (Entrevista com veterinário da Prefeitura de Iturama/MG,28/11/2006).
Em Nova Alvorada do Sul tinha 17 áreas que seriam para a reforma agrária. Com o arrendamento pra cana foram consideradas produtivas (Entrevista com representante da Comissão Pastoral da Terra –Dourados/MS, 01/12/2006).Nossa última demarcação aqui em novembro, dezembro do ano passado foi revertida. Eu acho que isso tem a ver com a chegada da cana aqui na região. Do jeito que vai o conflito por terra vai ser ainda maior (Entrevista com líder indígena Guarani-Kaiowá – Dourados/MS,02/12/2006).
Leia o documento "Despoluindo Incertezas: impactos locais da expansão das monoculturas energéticas no Brasil e replicabilidade de modelos sustentáveis de produção e uso de biocombustíveis" em Ríos Vivos
Fuente: ENVOLVERDE