Clima de medo e ameaças persistem entre Avá Guarani no oeste do Paraná: 'Estamos abalados física e psicologicamente'

Idioma Portugués
País Brasil
- Indígenas Avá Guarani do oeste paranaense têm medo de se identicar e se tornarem alvos de novos ataques - Foto: Mayala Fernandes.

Comunidade relata ameaças, vigilância de pistoleiros e insegurança alimentar mesmo com a presença da Força Nacional.

Os Avá Guarani que vivem na Terra Indígena (TI) Tekoha Guasu Guavirá, no oeste do Paraná, seguem enfrentando um clima de medo e insegurança, agravado por ataques violentos que deixaram feridos e aumentaram a tensão na região. Apesar da presença da Força Nacional, as comunidades  relatam confinamento territorial, insegurança alimentar e vigilância constante por supostos pistoleiros.

"Recebemos uma nova ameaça e não sabemos quando o ataque pode acontecer", disse uma moradora da aldeia, que pediu anonimato por questões de segurança. "Eles nos tratam como bicho. Eu não tenho mais força e não sei até quando vamos aguentar conviver com isso."

Em janeiro, um  ataque na aldeia Yvy Okaju deixou  duas crianças e dois jovens feridos. Entre eles, Matidiel Velasquez, 7, conhecido como "o menino do sorriso" por sua alegria contagiante, foi baleado na perna. Ainda em recuperação, Matidiel enfrenta dificuldades emocionais e físicas.

"Eu fico preocupado com a segurança do meu filho, nem consigo dormir à noite. Ele também tem dificuldade para dormir, acorda assustado com qualquer barulho", relatou o pai, que também não quer ser identificado.

Outro ferido foi Doroteu Martines Jara, 25, atingido por um tiro na coluna enquanto comemorava a chegada do ano novo com a família. "Os brancos estavam nos caçando. Não ouvimos passos, só os tiros", lembra. Agora paraplégico, Doroteu lamenta a perda da autonomia. "Eu cuidava da minha roça de mandioca. Agora, não consigo mais mexer as pernas nem me sentar."

Escalada de violência após retomadas

Os conflitos na região se intensificaram a partir de 2023, após os Avá Guarani realizarem retomadas de terras consideradas sagradas para seu povo. Essas ações têm sido frequentemente retaliadas com violência, como incêndios de casa, destruição de plantações e o uso de agrotóxicos para envenenar animais e pessoas. Desde o início dos conflitos, 12 pessoas foram baleadas.

"Não tivemos Natal nem Ano Novo. Estávamos apavorados com os ataques. Ninguém aqui dorme mais; ficamos atentos a qualquer barulho", contou outra moradora, também vítima de violência. Ela foi baleada em janeiro de 2024 e ainda carrega as marcas de nove tiros na perna.

Vigilância constante e medo de novos ataques

Lideranças da comunidade destacam que os moradores vivem em constante alerta. Vilma Rios, relatou que guerreiros indígenas se revezam na vigilância noturna. "Alguns dizem que nem pensam mais em dormir, com medo de ataques ou incêndios nas casas", afirma.

Desde o último ataque, relatos de pessoas rondando as casas à noite são frequentes. "Acreditamos que pode haver outro ataque. Talvez eles queiram queimar as casas", alerta Vilma.

Ilson Okaju, outra liderança, reforça o clima de tensão na comunidade e a pressão psicológica das ameaças. "Nos sentimos ameaçados constantemente. Estamos em alerta e abalados física e psicologicamente."

Para conter a escalada de violência, o governo federal publicou em novembro a portaria nº 812, que autoriza a permanência da Força Nacional na região. Após o ataque de janeiro, o Ministério da Justiça e Segurança Pública aumentou em 50% o efetivo na TI.

A Força Nacional informou que intensificou as rondas e a fiscalização na área, inclusive nas estradas que cercam a aldeia, após tomar conhecimento de novas ameaças. No entanto, as comunidades indígenas seguem vivendo sob constante temor e incerteza.

- Edição: Ana Carolina Caldas.

Fonte: Brasil de Fato

Temas: Pueblos indígenas

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