Carta das entidades contra a flexibilização dos agrotóxicos no Brasil
Sociedade civil já estão se mobilizando para pressionar o governo a fim de que as conquistas sobre o controle da produção e uso dos agrotóxicos no Brasil sejam garantidas
NA FLORESTA TEM DIREITOS! JUSTIÇA AMBIENTAL NA AMAZÔNIA.
s@raC,
Nos últimos dias, foram veiculadas na imprensa notícias sobre a pauta de negociação do “tratoraço” promovido pelo setor agrícola e sobre o aceno do governo brasileiro em permitir a mudança da legislação, para possibilitar a livre comercialização de agrotóxicos. A Anvisa preparou um Nota Técnica denunciando essa tentativa de flexibilização da legislação de agrotóxicos. E algumas das organizações da sociedade civil já estão se mobilizando para pressionar o governo a fim de que as conquistas sobre o controle da produção e uso dos agrotóxicos no Brasil sejam garantidas. A ABRANDH, com o apoio da FASE, preparou uma nota a ser enviada ao MAPA, Casa Civil, MMA e Ministério da Saúde.
Solicitamos o apoio das entidades a Carta em anexo. As organizações que queiram aderir assim o façam enviando o apoio a rb.gro.esaf@assenav
Atenciosamente,
Vanessa Schottz
Assessora
FASE - Programa Agroecologia e Direito à Segurança Alimentar
Rua das Palmeiras, 90 - Botafogo
22270-070 - RIO DE JANEIRO - RJTel.: (21) 2536-7368 - Fax: (21) 2286-1209 / rb.gro.esaf@esaf / www.fase.org.br
Carta das organizações ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
A/C:
Exmo. Sr. Roberto Rodrigues
Ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento
As entidades da sociedade civil e os parlamentares abaixo-assinados, com base nas notícias veiculadas na imprensa no que tange à pauta de negociação do tratoraço, e considerando que,
1. O Estado brasileiro tem obrigação de respeitar, proteger e promover os Direitos Humanos à Alimentação Adequada, Saúde e Meio Ambiente, previstos na legislação brasileira e assegurados nos tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Governo Brasileiro;
2. A Constituição Federal Brasileira em seu artigo 225, § 1o atribuiu ao Poder Público a obrigação de controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e meio ambiente, no que se inclui o controle dos produtos fitossanitários;
3. A Lei n° 7.802, de 11 de julho de 1989, relativa a produtos fitossanitários e outros produtos, instituiu a exigência de que os mesmos sejam previamente registrados para fins de produção, importação, exportação, comercialização e utilização, atendidas as diretrizes e exigência dos órgãos federais responsáveis pelos setores da saúde, da agricultura e do meio ambiente;
4. O Estado brasileiro tem obrigação de promover a defesa do consumidor e zelar pela saúde de todos (arts. 5º., XXXII e 196);
5. A cidadania e a dignidade da pessoa humana são fundamentos do Estado Democrático Brasileiro (art. 1º, II e III);
6. O Decreto 4.074/02, que trata da regulamentação de agrotóxicos no Brasil, constitui-se em um instrumento importante para minimizar ou impedir decisões contrárias à segurança, ao bem-estar e interesses da população brasileira;
7. O consumo de agrotóxicos sempre terá um custo social e ambiental e o Brasil é um dos maiores consumidores de agrotóxicos no mundo e o 1o no âmbito da América Latina.
(Nome da organização) abaixo-assinada pede e espera que o Governo brasileiro, especialmente o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o Ministério da Saúde e o Ministério do Meio Ambiente atendam às seguintes reivindicações da sociedade:
* Considerando a proposta elaborada pós-tratoraço por parcelas importantes do setor produtivo onde foram sugeridas alterações ao Decreto 4.074/02 (vide Anexo I da presente Carta) e o aceno do governo brasileiro em permitir a mudança da legislação com vistas a facilitar a comercialização de agrotóxicos, torna-se imperativo que:
- No que tange à possibilidade de alteração do Decreto nº. 4.074/02 para “flexibilizar” o registro de produtos agrotóxicos, aspectos relativos a potenciais riscos ao meio ambiente, segurança alimentar e nutricional e saúde da população brasileira devem ser devidamente levados em conta como prioridade. Medidas concretas devem ser adotadas neste sentido.
- Nenhuma modificação ao Decreto 4.074/02 deve ser realizada sem plena participação da sociedade civil. Vale ressaltar que o processo de elaboração do Decreto 4.074/02 foi realizado de forma transparente e participativa, tendo em vista inclusive a complexidade do tema em questão. O anteprojeto do Decreto foi submetido pela Casa Civil à consulta pública em outubro de 2000. As sugestões enviadas foram devidamente analisadas tendo várias das propostas sido contempladas no mencionado Decreto, ampliando em seu texto a relevância concernente às questões da saúde e do meio ambiente, tendência esta observada já há algum tempo principalmente nos países desenvolvidos. Neste sentido, nenhuma alteração ao Decreto poderá ser realizada sem garantia de ampla participação de representantes da sociedade civil e sem consulta pública.
- A proposta de extinção do Comitê Técnico de Assessoramento para Agrotóxicos (CTA) não deve ser acatada pelo governo brasileiro. O CTA visa à harmonização do inter-relacionamento dos setores da agricultura, saúde e meio ambiente no que se refere aos procedimentos técnico-científicos e administrativos concernentes ao registro e à utilização de agrotóxicos e, neste sentido, a necessidade de garantir a continuidade de sua atuação torna-se incontestável.
- A possibilidade de livre importação de agrotóxicos do Mercosul, ou uma “flexibilização” aquém das exigências de avaliação toxicológica ou ecotoxicológica hoje efetuadas no Brasil, constitui-se em um grave risco ao meio ambiente e potencial violação dos Direitos Humanos à Alimentação Adequada, à Vida e à Saúde tanto dos consumidores de produtos agrícolas quanto dos trabalhadores expostos. E, considerando que o princípio do livre comércio, não pode, em hipótese alguma, sobrepor-se a legítimas preocupações com a proteção à segurança alimentar e nutricional, à saúde e ao meio ambiente, sob pena de risco de violação de direitos humanos fundamentais, o governo brasileiro tem a obrigação de tomar todas as medidas cabíveis para garantir que a proposta de flexibilização aquém das exigências de avaliação toxicológica ou ecotoxicológica atuais não seja acatada.
- A fiscalização dos agrotóxicos é uma atividade de difícil execução no Brasil, entre outros motivos pela grande extensão territorial do país. Neste sentido, todos os cuidados devem ser tomados no processo de registro desses produtos, já que o registro é um procedimento básico de controle para impedir que produtos com riscos inaceitáveis sejam produzidos, importados, exportados, comercializados ou usados.
- Esperamos, por fim, que o governo brasileiro não ceda à pressão de concentrar a avaliação e registro dos produtos agrotóxicos em um único órgão, particularmente na agricultura, eliminando a participação de outros setores diretamente envolvidos com o tema, como saúde e meio ambiente. A eliminação da participação dos setores da saúde e meio ambiente se configuraria em um inegável retrocesso por parte do governo brasileiro na medida em que a tendência mundial tem sido exatamente no sentido de garantir, cada vez mais, a participação destes setores nos assuntos concernentes ao tema.
Atenciosamente,
(assinatura da organização)
c/cópia para
Ministério do Meio Ambiente
Exma. Sra. Marina Silva – Ministra de Estado
Ministro da Saúde
Exmo. Sr. Saraiva Felipe – Ministro de Estado
Ministra de Estado Chefe da Casa Civil
Exma. Sra. Dilma Rousseff – Ministra de Estado
Ministério de Estado de Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exmo. Sr. Luiz Fernando Furlan – Ministro de Estado