Campanha reforça importância do Cerrado para segurança alimentar de povos tradicionais
Ao todo, 75 instituições nacionais e estrangeiras lançaram campanha #CerradoEmExtinção para lembrar o quanto ele é ameaçado pela monocultura, pela criação de gado e pela mineração; bioma já perdeu 47% de sua cobertura original.
Publicada por De Olho Nos Ruralistas
— Tem o pequi, tem a mangaba, a pinha, tem a fruta de leite, tem várias espécies que as vezes até foge. Ultimamente, com a chegada das empresas, a gente tem perdido muito dos nossos córregos e estamos lutando para ter a natureza de volta, em uma luta pela terra, pelo direito de ser geraizeiro e de colher os frutos do Cerrado.
É o que conta a geraizeira Alaíde de Almeida, que vive no Vale das Cancelas, em Minas Gerais. Ela enumera alguns dos frutos do Cerrado que garantem à extrativista e à sua comunidade segurança alimentar e geração de renda.
Seu depoimento faz parte da campanha #CerradoEmExtinção, lançada na última sexta-feira (11), Dia Nacional do Cerrado, por 75 organizações sociais nacionais e estrangeiras, com o objetivo de chamar a atenção de governos, instituições sociais, empresas e da sociedade civil para o desmatamento que há anos assola o bioma e já destruiu 46,8% de sua cobertura vegetal originária, segundo dados do MapBiomas.
Como parte da campanha, organizações participantes — Slow Food Brasil, Comitê Chico Mendes, Comissão em Defesa dos Direitos das Comunidades Extrativistas, Associação Xavante Warã, entre outras — divulgaram centenas de fotografias e depoimentos de moradores de comunidades tradicionais do Cerrado para chamar a atenção sobre como a degradação do ambiente afeta diretamente os recursos naturais e o modo de vida da população.
Cerrado concentra 18% dos focos de queimadas em agosto
Uma das prioridades da campanha é mostrar que pelo menos 100 mil pessoas vivem no bioma, entre assentados da reforma agrária, extrativistas e povos tradicionais, como geraizeiros, quebradeiras de coco, comunidades de fundo de pasto, quilombolas e os povos originários, os indígenas, estes últimos divididos em 84 etnias e 216 terras indígenas presentes no Cerrado.
A campanha também chama a atenção para o fato de que o fogo, a mineração e a aprovação de licenciamentos ambientais ilegais também ameaçam o ecossistema. Marília Cyrme, representante da Coalizão do Clima São Paulo, que integra a campanha, lembra que defender o Cerrado significa defender a soberania alimentar do Brasil, já que a monocultura destrói o solo e as nascentes de água:
— Por décadas foi divulgada a ideia que o Cerrado é vazio, que não há pessoas vivendo lá, e nós queremos fazer esse contraponto, que existem diversas comunidades que vivem neste bioma e que dependem dele. Queremos lembrar as pessoas que o Cerrado também existe e que ele também é desmatado e queimado, como a Amazônia.
A intenção da campanha é retomar as postagens e as hashtags todo dia 11 de cada mês, para manter ativo o debate sobre a importância de preservar o Cerrado.
Sozinho, o Cerrado concentrou 13% do total de alertas de desmatamento de 2019 e quase um terço da área total desmatada no país (33,5%): “Destruição do Cerrado em 2019 foi mais rápida que na Amazônia e avançou sobre áreas protegidas”. Segundo levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), o bioma, que abriga as savanas mais biodiversas do mundo, respondeu por 18% de todas os incêndios florestais registrados em agosto.
O Cerrado é o segundo maior bioma da América do Sul e se estende por onze Unidades da Federação, que compõem 22% do território nacional. A vegetação típica da área é de campos, savanas e matas fechadas, com grande diversidade. Pesquisas estimam que ao menos 2.500 espécies de animais vivam no Cerrado, além de 12 mil espécies de vegetais. A região possuí ainda enorme potencial hídrico, abrigando as nascentes de rios como o Araguaia, Jequitinhonha, Tocantins e Formoso, ameaçados pela captação d’água para projetos de irrigação agropecuária: “Fazendeiros ameaçam bacia do Rio Formoso, em Tocantins, com plantações de soja”.
Fonte: Instituto Humanitas Unisinos