Brasil: fraude cientifica a serviço da Syngenta e seu milho
O grupo Cymru Livre de Transgênicos (Cymru é como se chama o País de Gales em galês) divulgou recentemente um comunicado à imprensa revelando as falhas contidas em um estudo italiano em que ovelhas foram alimentadas com o milho transgênico Bt176 da Syngenta, visando avaliar a segurança do produto para o consumo -- um verdadeiro caso de fraude científica.
O caso merece ser relatado pois ilustra como são conduzidos os estudos que levam à aprovação dos produtos transgênicos, e aos quais órgãos como a nossa CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) se agarram para alegar que a segurança destes produtos para a saúde e o meio ambiente “está mais do que provada”.
A pesquisa italiana parece ter sido especificamente desenhada e conduzida para confirmar a hipótese da ausência de riscos. Entre 2002 e 2005, cientistas da Universidade de Perugia financiados pelo Ministério da Saúde da Itália conduziram um estudo envolvendo 106 ovelhas em fase de reprodução, das quais um grupo foi alimentado com uma dieta contendo o milho Bt176. No artigo científico que divulgou os resultados faltam informações cruciais.
O preâmbulo do artigo diz que “faltam estudos de longo prazo conduzidos com um alto número de animais durante várias gerações com o objetivo de avaliar os efeitos de alimentos transgênicos na criação de animais”, indicando que o estudo cobriria esta lacuna. Mas ele não o faz. Curiosamente, embora o estudo tenha durado o período de três gerações, apenas uma geração de ovelhas foi alimentada com o milho transgênico, e aos seus filhotes não foi dada qualquer quantidade de milho transgênico. O tamanho real do grupo testado não é informado em nenhum lugar do relatório.
Outro dado curioso, é que a quantidade de milho transgênico dada ao grupo de ovelhas testado foi muito pequena, representando apenas 5,6% de sua dieta, exceto durante o período de lactação, em que a proporção foi aumentada para 19,4%.
Os pesquisadores encontraram diferenças importantes em 4 dos 30 parâmetros de sangue investigados e em alguns itens as diferenças estavam muito próximas de significância estatística. Ainda assim, estes resultados foram efetivamente desconsiderados ou desmentidos. Também as diferenças histológicas encontradas entre o grupo controle e o grupo de ovelhas testadas foram classificadas como “preliminares”, fazendo parecer que os cientistas não tiveram permissão para conduzir estudos detalhados sobre as amostras dos tecidos.
Além de todos estes problemas, identifica-se uma série de falhas na escolha dos métodos de análises laboratoriais escolhidos, na interpretação dos resultados e falta de detalhes na avaliação das causas das mudanças funcionais e celulares encontradas.
Em sua investigação sobre estes resultados, o Cymru Livre de Transgênicos descobriu que os primeiros avaliadores do relatório na revista científica Livestock Science, que publicou o artigo, expressaram preocupação acerca destas mudanças fisiológicas e indicaram que elas deveriam ser investigadas e elucidadas, mas a revista resolveu publicar o estudo assim mesmo.
Segundo o Dr. Brian John, renomado cientista e membro do Cymru Livre de Transgênicos, em 2004, sob forte pressão da Syngenta acerca das mudanças celulares descobertas no estudo, foi tomada a decisão de se abandonar a pesquisa e de se impedir que fosse publicada. Era uma época muito sensível para a Syngenta, logo após a revelação de que vacas que haviam morrido na Alemanha haviam sido alimentadas como milho Bt176. Posteriormente tomou-se a decisão de relatar os resultados da pesquisa e de submetê-los à publicação, possivelmente porque a Syngenta já havia desistido de colocar o Bt176 no mercado.
Mas, conforme observa o Dr. John, desde o começo este estudo, assim como a maioria dos estudos deste tipo, foi desenhado para provar a equivalência nutricional entre o milho transgênico e o não-transgênico, e para demonstrar que a saúde e a performance dos animais não seria negativamente afetada pelo consumo do milho transgênico. Ele tem todos os sinais de um estudo cuidadosamente fabricado para a promoção de uma conclusão aceitável para a Syngenta. Os resultados do estudo foram efetivamente predeterminados quando o componente transgênico na alimentação das ovelhas foi estabelecido em quantidade absurdamente pequena. Além disso, apenas um pequeno grupo de ovelhas em fase de reprodução foi alimentada com a dieta de teste, quando houve a oportunidade de se estudar três gerações. E uma demanda por estudos mais detalhados foi negada quando a evidência de proliferação ativa de células basais foi descoberta.
Este estudo, tendencioso desde o início para uma conclusão de ausência de riscos, é mais um exemplo da influência pérfida das corporações de biotecnologia sobre o trabalho honesto de pesquisa de cientistas em instituições acadêmicas.
O único consolo que se pode tirar deste caso particular é que as evidências deste estudo sobre os danos ao pâncreas, fígado e epitélio ruminal de ovelhas alimentadas com milho transgênico pode ter ajudado a convencer a Syngenta de que o milho Bt176 era uma variedade instável e fundamentalmente perigosa, apressando seu fim.
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Maiores informações em:
Bt176 sheep feeding study -- another case of scientific fraud?
Press Notice from GM Free Cymru, 10th March 2008
Campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos
Número 387 - 07 de abril de 2008
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