Brasil: agrotóxico e tiroteio sobre famílias sem-terra
As cerca de 500 famílias que acampam às margens da RS-040 há três meses pedem providências da Justiça. Marcelo José da Costa Petry, promotor do município, disse que irá investigar o caso e que pode ocorrer apreensão das armas e prisão dos acusados. O MP também informou que enviaria um bioquímico ao acampamento para averiguar resquícios de químico nos barracos
Em Nonai (RS), MST denuncia à Justiça que fazendeiro usa avião agrícola para jogar veneno e usar armas de fogo contra acampados
Acampados do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no município de Nonoai (RS) encaminharam no dia 1º, à Promotoria de Justiça, denúncias de violência praticada por jagunços de uma fazenda em frente ao acampamento. Um avião agrícola do fazendeiro Alberto Ângelo Tagliari, proprietário da Fazenda Real, foi utilizado para pulverizar veneno sobre as famílias, enquanto pistoleiros disparam diversos tiros contra os barracos. O MST entregou fotografias e projéteis de armas de fogo comprovando a denúncia.
As cerca de 500 famílias que acampam às margens da RS-040 há três meses pedem providências da Justiça. Marcelo José da Costa Petry, promotor do município, disse que irá investigar o caso e que pode ocorrer apreensão das armas e prisão dos acusados. O MP também informou que enviaria um bioquímico ao acampamento para averiguar resquícios de químico nos barracos.
Ivanir Loureiro, da coordenação do acampamento do MST, conta que a presença de pistoleiros atentando contra o acampamento é um fato comum no local. A pulverização dos barracos é uma atitude a mais dos fazendeiros contra as famílias. "Isso aqui, na verdade, vem há dias. Pistoleiros aterrorizam as famílias e as crianças. E hoje, por volta das 8 horas da manhã, um avião agrícola começou a passar veneno em cima dos barracos, com pistoleiros dando tiros contra as pessoas de cima de uma caminhonete", afirma. Segundo relatos de outro acampado, Givanildo Poncio, por volta de 15 pistoleiros, divididos em duas caminhonetes, deram mais de 100 tiros contra o acampamento.
Porém, para o advogado do fazendeiro, Mauro Machado, o avião foi contratado para aplicar "defensivo recomendado, e não veneno" na plantação porque os funcionários da fazenda foram impedidos de fazer a aplicação com máquina pulverizadora no dia 30. Os sem-terra rebatem afirmando que o avião pulverizou a área durante uma hora, inclusive o acampamento, e deu rasantes sobre os barracos. "Esse não é um caso único, estão fazendo isso com freqüência", salienta Poncio. Os acampados estão realizando levantamento para verificar se há pessoas passando mal devido ao veneno. O filho de um pequeno proprietário vizinho à fazenda teria dado entrada em hospital, por causa do veneno.
Reintegração
Além do ocorrido, o acampamento sofre processo de reintegração de posse da RS-406, emitido pelo Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (DAER) e por Tagliari. O pedido já havia sido negado pela juíza Lisiane Marques Pires, de Nonoai, em 2004. Na ocasião, ela também coordenou um acordo, em audiência pública, entre os sem-terra, os órgãos governamentais e a prefeitura para que os acampados somente sofressem despejo se fossem deslocados para outra área. No entanto, Lisiane entrou em férias e o juiz substituto, Eduardo Coelho Antonello Benites, voltou atrás e derrubou a liminar, determinando a reintegração de posse da beira de estrada.
Para a assessoria jurídica do MST, a decisão de Coelho mostra o comprometimento do juiz com os fazendeiros locais por ter anulado a decisão da juíza oficial em favor do agronegócio local. A fazenda Real, de onde partem os disparos e o avião que jogou veneno no acampamento, é uma área de cerca de 2.800 mil hectares, cujo proprietário, Alberto Ângelo Tagliari, possui cerca de 52 mil hectares de terra no Brasil. Em 2005, menos de 161 novos lotes foram destinados, pelo governo federal, para assentamento de famílias gaúchas. Colaborou Daniel Cassol.
Por Raquel Casiraghi
de Porto Alegre (RS)
Fuente: Brasil de Fato