Brasil: a novela da regulamentação da Lei de Biossegurança
A novela da regulamentação da Lei de Biossegurança pode estar chegando ao fim. Depois de meses de discussão parece que a Casa Civil pretende levar a matéria ao Presidente Lula para por fim às divergências internas e assinar o Decreto de Biossegurança
Recentemente, um grupo de cientistas foi ao Distrito Federal para pedir a rápida publicação do Decreto. Os principais embates internos no governo federal giram em torno do quorum necessário para aprovação de liberação comercial de OGMs e da forma de escolha dos cientistas que irão integrar a CTNBio Comissão Técnica Nacional de Biossegurança.
A sociedade civil e cientistas independentes temem que a Comissão continue, como a anterior, povoada por membros mais preocupados com promoção de biotecnologia que propriamente com biossegurança. O fato recebera críticas do Poder Judiciário, do Ministério Público Federal e de organizações não governamentais e era notório a ponto de o jornalista Cláudio Humberto, afirmar que "A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, a CTNBio, do Ministério da Ciência e Tecnologia, tem tantos representantes de empresas e cientistas pendurados em verbas de multinacionais, como a Monsanto, que ganhou apelido de pesquisadores independentes: CTNBingo! (em 29/02/04).
Lamentavelmente, essa proximidade entre público e privado no setor de biotecnologia não ocorre apenas no Brasil. Muitos já devem conhecer o artigo de Jennifer Ferrara intitulado Portas Giratórias: a Monsanto e o Governo Federal, The Ecologist (vol. 28, n.5, setembro/outubro 1998), aqui. Lá está descrito o processo de liberação de OGMs nos Estados Unidos, valendo-se do primeiro produto alimentício da biotecnologia comercializado em grande escala, o hormônio recombinante de crescimento bovino (rBGH) da Monsanto.
Mesmo estando relacionado a problemas graves de saúde nos seres humanos e nas vacas e apesar ainda dos escândalos e protestos, a autora relata que “a adequada combinação de apoio governamental, pesquisa privada e milionários projetos de marketing prepararam o terreno para a primeira liberação” nos EUA.
Michael Hansen da Consumers Union já afirmara que a FDA Food and Drugs Administration declarou que o leite com rBGH era seguro antes de dispor dos dados necessários. É o que as organizações e cientistas independentes receiam com relação a outros alimentos transgênicos: órgãos governamentais confiando nos dados apresentados quase que exclusivamente pela própria empresa interessada em sua aprovação.
O caso relatado no artigo Portas Giratórias: A Monsanto e o Governo Federal traz informações sobre a falta de avaliação de riscos por parte do FDA. Mais do que isso, revela nomes de pessoas que desempenharam papéis importantes no processo. Cita Michael R. Taylor, então vice-comissário de política da FDA que redigiu as normas do FDA para a rotulagem da rBGH, praticamente impedindo que houvesse informação no rótulo. Logo depois, descobriu-se que Taylor havia trabalhando durante anos como advogado da Monsanto, inclusive preparando documentos sobre rotulagem de leite contendo rBGH. Margaret Miller, vice-diretora do Escritório de Novos Fármacos Animais do FDA também já havia sido pesquisadora da Monsanto, inclusive desenvolvendo estudos sobre a segurança do rBGH. Suzane Sechen, considerada a principal avaliadora da segurança do rBGH na Oficina de Novos Fármacos Animais do FDA havia realizado pesquisas sobre o rBGH, na Universidade de Cornell, financiados pela... Monsanto.
Anos atrás, a organização Alliance for Bio-Integrity conseguiu acesso, por meio de autorização da Justiça norte-americana, a documentos internos do FDA que bem demonstram a preocupação de cientistas do órgão ( aqui) e a irresponsabilidade do FDA em ignorar tais alertas.
É para evitar que Michael Taylor, Margaret Miller ou Suzane Sechen brasileiros decidam sobre a segurança de espécies transgênicas que as organizações irão monitorar e denunciar relações promíscuas e agir diante de decisões que não se baseiem exclusivamente no princípio da precaução.
Campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos
Número 278 11 de novembro de 2005
E-mail: rb.gro.atpsa@socinegsnartedervil