Brasil: Curitiba: mil pessoas em defesa da soberania alimentar
Entre os manifestantes, histórias como a da camponesa Adelaide de Lima que ficou com feridas na boca e inflamação na garganta por causa do uso de agrotóxicos em plantações
Mais de mil militantes ligados à Via Campesina roubaram a cena, dia 17, na 3a Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança (MOP3, na sigla em inglês). Eles chegaram pela manhã e se posicionaram na estrada em frente ao ExpoTrade Center, em Pinhais, região metropolitana de Curitiba (PR), para “recepcionar” os delegados que participam do encontro. Saíram em 40 ônibus do acampamento “Terra Livre de Transgênicos”, no Parque Newton Freire Maia, a 20 quilômetros da capital paranaense. Participantes do 2º Encontro Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) também foram ao ExpoTrade engrossar a manifestação. Organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e pelo Movimento das Mulheres Camponesas (MMC), o protesto procurou deixar clara a diferença de projeto entre a agricultura familiar e o agronegócio por meio de gritos como: “Transgênico é veneno / Monsanto assassina / Vocês estão na mira / Da Via Campesina”.
O mexicano Alberto Goméz, coordenador executivo da União Nacional de Organizações Regionais Camponesas Autônomas (Unorca), define essa diferença: a agricultura familiar produz alimentos para o povo, convive em harmonia com a natureza e gera empregos; já o agronegócio contamina o meio ambiente com produtos tóxicos, agride a biodiversidade, exporta sua produção para servir de ração nos países chamados desenvolvidos e baseia-se na automação e na exploração de mão-de-obra barata. “Com o Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta), os Estados Unidos passaram a abastecer as comunidades pobres do México com comida, principalmente milho. Entretanto, 50% desses carregamentos eram transgênicos e uma parcela dos agricultores usou as sementes para plantar. Resultado, o campo mexicano está repleto de cultivos transgênicos, sem que o seu cultivo e comercializam estivessem legalizados. Os efeitos na saúde e no meio ambiente são imprevisíveis”, descreve com indignação Gómez.
Ali no quintal
A agricultora Palmira Hanke, que possui uma propriedade de dez hectares em Turvo (PR), está preocupada com a contaminação de organismos geneticamente modificados em seu terreno. “Nós plantamos ecológico, se os vizinhos cultivarem transgênicos, vão germinar na minha terra. Ainda mais se for milho. Corro até o risco de ter que pagar royalties (direito de licença de uso da semente) para a Monsanto”, afirma Palmira. A sua amiga Adelaide de Lima tem uma história ainda pior para contar. Nos dias 3 e 4, foi contratada para trabalhar no cultivo de batata. “A gente pegava as batatinhas com as mãos e íamos plantando. Dava para sentir o cheiro do veneno, mas não tinha luva, nada. No final do segundo dia, estava com feridas na boca que só começaram a melhorar nos últimos dias. Tive também inflamação na garganta, no nariz e nos olhos”, relata Adelaide. Ao todo, foram 16 horas trabalhadas para ganhar R$ 30. Mesmo valor que a empresa, situada no município de Antônio Olinto (PR), arrecada com a venda de seis quilos de batata palha.
Luís Brasilino
Enviado especial a Curitiba (PR)
Fonte: Brasil de Fato - http://www.brasildefato.com.br/