100 milhões de árvores: Conheça o plano nacional de plantio do MST
Na última reunião da Coordenação Nacional do MST, que aconteceu em Sarzedo, região metropolitana de Belo Horizonte, MG, o MST lançou o Plano Nacional “Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis”.
A proposta é que nos próximos 10 anos, famílias acampadas e assentadas Sem Terra e a sociedade em geral plantem 100 milhões de árvores em todos os estados do país.
O Plano tem como objetivo realizar a recuperação de áreas degradadas por meio da implementação de agroflorestas e quintais produtivos.
Além disso, o projeto também é denunciar as ações de destruição ambiental do agronegócio, da mineração e construir no MST e na sociedade o entendimento que Reforma Agrária é sinônimo de alimentação saudável e de cuidado com os bens comuns da natureza.
“O nosso projeto também é uma forma de denunciar a crise estrutural do capital na sua dimensão ambiental, que é acelerada pelo governo Bolsonaro”, afirmou Bárbara Loureiro, do Setor de Produção do MST.
Segundo a Agência Oceânica e Atmosférica Americana (NOAA), julho de 2019 foi considerado o ano mais quente da história. Já a Organização Meteorológica Mundial (OMM) afirma que a última década (2010-2019)
registrou as mais altas temperaturas já obtidas.
No Brasil, Bolsonaro chegou a criticar a existência de áreas protegidas no país, afirmando que elas atrapalham o desenvolvimento do país O mais recente ataque do governo foi o projeto de lei encaminhado ao Congresso Nacional na última quinta-feira (6), que permite a mineração e outros empreendimentos em terras indígenas, além de autorizar o plantio de sementes transgênicas nestas áreas. Tais práticas são proibidas desde 2007, justamente para preservar a biodiversidade.
2019: o pior ano para o meio ambiente no Brasil
Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), em julho de 2019 o desmatamento na Amazônia foi 278% maior do que o mesmo mês em 2018. Tal índice foi alcançado em meio à negação da ciência por Bolsonaro, ao duvidar de dados publicados por órgãos do próprio governo, alegando que tais publicações estariam “a serviço de alguma ONG”. As críticas feitas pelo presidente resultaram na demissão de Ricardo Galvão, que na época era diretor do INPE, e um dos mais importantes cientistas brasileiros na área.
A forma como o governo tratou as queimadas na Amazônia ano passado despertou discussão e repúdio em todo o mundo. Philip Alston, relator da ONU para Extrema Pobreza e Direitos Humanos, afirmou que as políticas de Bolsonaro representam uma ameaça ao meio ambiente mundial. Angela Merkel, chanceler alemã, declarou que via com preocupação a situação das
queimadas na Amazônia. Já Emmanuel Macron, presidente da França, ameaçou não assinar o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul.
Liberação de agrotóxicos bateu recorde
Somente em 2019, o governo Bolsonaro autorizou o uso de 439 novos agrotóxicos, sendo que, 34% destes são proibidos na União Europeia. Entre 2010 (quando os dados começaram a ser coletados) e 2019 o número de venenos autorizados cresceu 322%.
A liberação de plantas transgênicas também disparou no período. Até setembro do ano passado, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) tinha permitido o uso de 22 novas plantas modificadas. Desde quando Dilma Rousseff sofreu o golpe, em 2016 e a eleição de Bolsonaro, 32 plantas foram liberadas. Já entre 1998 e 2015 foram 53 novas autorizações,
segundo dados do Conselho de Informações sobre Biotecnologia.
Uma ameaça para a segurança alimentar
O Plano Nacional “Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis” buscará ser mais do que uma campanha de reflorestamento. “Como resultado dos acúmulos no tema da agroecologia, estamos falando em sistemas produtivos com árvores” explica Bárbara Loureiro. “O Plano articulará produção de alimentos saudáveis, soberania alimentar, com cuidado dos bens comuns e geração de renda para as famílias”, ressalta.
E, ao contrário do que a Ministra da Agricultura, Tereza Cristina, afirmou em viagem à Europa, o agronegócio brasileiro não tem nada de sustentável.
Um estudo detalhado da FAO, Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, descobriu que 71% de todo o desmatamento na Amazônia Legal brasileira entre 2000 e 2013 foi convertido em pastagens. Desde 2006, o plantio de soja avançou 3,5 milhões de hectares sobre a Amazônia. Fato tornado público na época, em março de 2017 o Ibama interditou diversas empresas, entre elas a JBS, líder do setor de frigoríficos, por comprarem gado de áreas embargadas por desmatamento ilegal.
No bioma Cerrado a situação não é diferente. Ele já perdeu 2,8 milhões de hectares de florestas naturais e 1,8 milhão de hectares de pastagens naturais entre 2010 e 2017, segundo o Projeto MapBiomas, que envolve diversas instituições de pesquisa. Assim como na Amazônia brasileira, a pecuária tem sido a principal responsável do desmatamento: quase um quarto do Cerrado, cerca de 48,5 milhões de hectares era pastagem em 2017.
Chuvas fortes estão ligadas à crise ambiental
A previsão dos cientistas do IPCC, painel da ONU para mudanças climáticas, é que a temperatura global suba 7°C até 2100, contrariando previsões anteriores de uma alta de 4,8°C. Ainda de acordo com o painel da ONU, um mundo 1,5°C mais quente já seria terrível, com chuvas fortes cada mais frequentes e intensas, assim, como um aumento das secas extremas.
Estes fenômenos meteorológicos extremos já podem ser percebidos. As inundações como as vividas em 2019 no centro dos Estados Unidos, no norte do Canadá, da Rússia e no Sudoeste da Ásia, que receberam precipitações anormalmente altas já são exemplos, segundo a ONU.
No Brasil, 2020 começou com uma série de desastres por conta das fortes chuvas. Até o dia 3 de fevereiro, Minas Gerais registrou 58 pessoas mortas, 8.200 desabrigadas e quase 45 mil desalojadas por conta das fortes chuvas. Situação de emergência foi decretado para 196 municípios no estado.
Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia, MG registrou o maior volume de chuvas dos últimos 110 anos. A reconstrução de Belo Horizonte, segundo o prefeito, Alexandre Kalil (PSD), poderá custar até 400 milhões de reais. No Rio de Janeiro, havia 13 desalojados, enquanto no Espírito Santo este número era de 12 mil pessoas.
Diante disto, o Plano Nacional não será somente uma ação interna do MST. É o que explica Loureiro, “sabemos que as cidades já são fortemente atingidas pela crise ambiental, por isto é fundamental o diálogo com diversos setores urbanos”.
Reforma Agrária e questão ambiental
A relação entre Reforma Agrária e questão ambiental não é recente no Brasil. Na década de 50, quando o debate ganhou força no país, a destruição dos solos e das florestas pelo latifúndio, principalmente de café e pasto, era um dos mais graves problemas da época. E a Reforma Agrária era vista justamente como solução para isto, devido a um uso mais racional dos bens naturais.
A retomada do debate acerca da democratização da terra, interrompido pelo golpe militar de 1964, recoloca a questão ambiental. “Enquanto o latifúndio sempre ficou marcado pela destruição da biodiversidade, a reforma agrária sempre foi vista como uma solução, a partir do uso mais racional do solo, como no assentamento Canudos, em Goiás, que possui a maior área de reserva de cerrado na região da Grande Goiânia”, exemplifica Barbara Loureiro.
Seguindo no acúmulo sobre a questão ambiental, em seu IV Congresso Nacional, o MST afirma seu “compromisso com a terra e a vida”.
E, consolidando este amadurecimento, no VI Congresso Nacional o MST passa a defender uma Reforma Agrária de caráter Popular. A partir de então, o programa agrário do Movimento defende a democratização da terra voltada para a produção de alimentos saudáveis para a classe trabalhadora.
Como lembra Barbara, o Plano Nacional “Plantar Árvores, Produzir
Alimentos Saudáveis” está alinhado a essa estratégia. “O plano reafirma dois elementos centrais da Reforma Agrária Popular, produzir alimentos saudáveis e cuidar dos bens comuns”, diz.
“O Plano Nacional nos dará uma tarefa muito importante para este período”, destaca Barbara Loureiro. “Teremos que ser os mensageiros do cuidado com a água, o ar, as florestas e todo o meio ambiente”, finaliza.
A alienação da natureza é a alienação do potencial da espécie humana
Importante geógrafo, formado em Cambridge, Reino Unido, David Harvey afirma no seu livro “17 Contradições e o Fim do Capitalismo” que a relação do capital com a natureza e com a natureza humana é extremamente alienante. “ O capital não pode senão privatizar, mercantilizar, monetizar e comercializar todos os aspectos possíveis da natureza”, afirma geógrafo.
Para o britânico, a alienação da natureza é a alienação do potencial da espécie humana. “Estão plantadas as sementes de uma revolta humanista contra a inumanidade pressuposta na redução da natureza e da natureza humana à pura forma-mercadoria”, conclui.
Fuente: MST