Brasil: Centro Chico Mendes de Agroecologia: terra livre de transgênicos e sem agrotóxicos
A Jornada de Agroecologia no Paraná vem alcançando de forma crescente ampla articulação entre várias organizações da agricultura familiar, da luta pela terra e de promoção da agroecologia, proporcionando a formação técnica de agricultores, agricultoras e jovens rurais, acampados e assentados, estudantes e técnicos, e marcando forte e intensiva presença junto à população em geral informando quanto aos perigos dos transgênicos e dos agrotóxicos para a saúde humana e para a natureza em geral
Terra Livre de Transgênicos e sem Agrotóxicos
www.jornadadeagroecologia.com.br
Paraná, Brasil
Conseqüência deste processo de articulação e ação técnica e política, por ocasião do 2º Encontro Estadual da Jornada de Agroecologia em 2003, na cidade de Ponta Grossa, no dia 10 de maio os participantes tomaram a decisão de realizarem um protesto em frente à área em uso pela transnacional dos Estados Unidos, Monsanto, onde esta desenvolvia experimentos com sua soja e milho transgênicos tolerantes ao herbicida roundup e à bactéria BT, respectivamente,, marcando assim sua indignação frente aos descasos que a Monsanto vinha demonstrando com o descumprimento das legislações brasileira de biossegurança e ambiental.
Esta ação alcançou ampla repercussão no país e a nível internacional, imprimindo especialmente no Paraná, um grande alerta geral frente ao problema da dispersão clandestina e criminosa de cultivos transgênicos e sua presença em alimentos industrializados amplamente disponibilizados nas redes de supermercados de todo o país.
Em 16 de maio, um grupo de famílias de agricultores resolveu ocupar a mesma área, onde fincaram acampamento. A Jornada de Agroecologia passou a apoiar os agricultores que lá estão, e a área passou a ser denominada Centro Chico Mendes de Agroecologia.
A partir de então, a Jornada de Agroecologia desenvolveu um projeto, para que o Centro Chico Mendes de Agroecologia cumprisse a missão de Conservação de Agrobiodiversidade, Melhoramento e Multiplicação de Variedades Crioulas e Formação em Agroecologia.
Neste período ainda, a Jornada de Agroecologia atuou no sentido de solicitar vistorias técnicas aos órgãos ambiental (IAP) e de fiscalização sanitária (SEAB) do Paraná, bem como à CTNBIO – Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, na área em que a Monsanto realizava os testes com plantas transgênicas. Uma equipe composta por estes órgãos estiveram na área constatando: agressão a mata ciliar, com sua quase total eliminação, com processo de desmoronamento da barranca do rio; inexistência de reserva legal proporcional; uso da área de preservação permanente para cultivo agrícola, ocorrendo o plantio do milho até as margens do rio; a Monsanto promove aplicação de agrotóxicos incidindo na área de preservação permanente; a área de descarte de produtos transgênicos permanecia continha soja e milho e estava parcialmente coberta por sombrite, possibilitando o acesso de aves e insetos.
Ao mesmo tempo, a Jornada de Agroecologia voltou-se para outra prioridade, realizando sucessivas reuniões com a bancada de Deputados Estaduais do Partido dos Trabalhadores, com quem foi elaborado um projeto de lei, propondo a proibição do cultivo, armazenagem, transporte e comercialização de transgênicos no estado do Paraná.
Todo este processo exigiu muito trabalho, até que o PL passasse pelas diferentes comissões na Assembléia Legislativa, e suas três votações foram acompanhadas por mobilizações sociais que lotaram as arquibancadas do plenário, consagrando as votações vitoriosas com esmagadora maioria dos Deputados, fechando o placar da ultima votação com 36 votos a favor da aprovação da lei com apenas 12 votos contrários,instituindo assim a lei 14.162/2003.
Outro grandioso momento de mobilização social e festa geral, foi o ato de sanção da lei 14.162 de 17/10/2003, pelo governador Roberto Requião, quando centenas de militantes fizeram uma grandiosa marcha da praça Tiradentes até o Palácio Iguaçu, participando desta que foi uma solenidade histórica no estado, instituindo assim o Paraná, terra livre de transgênicos . Desde então, o governo do estado passou a tomar sucessivas medidas de controle sobre os transgênicos no estado, especialmente impedindo o uso do porto de Paranaguá para exportação de produtos transgênicos, bem como instalando rigoroso controle nas divisas do estado, impedindo a entrada de soja transgênica vindas o Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Paraguai.
Para cumprir sua missão de centro de agroecologia, a Jornada de Agroecologia pôs em prática os Mutirões da Agroecologia – fora Monsanto , sendo que o primeiro deles com mais de 200 participantes deu-se nos dias 17 e 18 de outubro de 2003, quando foram implantados os campos de multiplicação de sementes de variedades crioulas.
Com o mutirão, a área foi transformada num verdadeiro mosaico de biodiversidade, e numa terra livre de transgênicos e sem agrotóxicos . Com a iniciação dos trabalhos com técnicas ecológicas de manejo agrícola, dos 48 hectares, cultivou-se 35 hectares com 24 variedades de feijão; 4 variedades de milho; 2 variedades de soja; 7 variedades de batata; 7 variedades de mandioca; 6 variedades de arroz e 13 variedades de adubos verdes de verão, além da horta, do pomar e do plantio de espécies nativas para recompor a mata ciliar.
Outros Mutirões da Agroecologia foram implementados, quando entre 9 e 10 janeiro de 2004, mais de 200 jovens rurais estiveram trabalhando na área, quando realizaram a colheita de campos de feijão, a capina de campos de arroz, trabalharam na horta e no pomar e na mata ciliar. Outro momento deu-se com 800 mulheres agricultoras em 8 de março, quando trabalharam na horta e na implantação de plantas medicinais, e outro em 17 e 18 de abril, um grupo de 130 mulheres trabalharam na colheita de milho, na horta e na implantação de plantas medicinais. Nestes momentos de mutirões, os participantes ainda participam de estudos e debates relacionados com a agroecologia.
Na safra 2003/2004, portanto, onde a transnacional Monsanto dos Estados Unidos contaminava a terra com roundup e transgênicos, a Jornada de Agroecologia resgatou aquele pedaço de chão para o povo brasileiro, e tornou-o uma terra livre de transgênicos e sem agrotóxicos , simbolizando para o Brasil e para o Mundo, que as sementes são patrimônio dos povos a serviço da humanidade.
Toda a produção da safra 2003/2004, totalizou 30 toneladas bruta, resultando em 20 toneladas de sementes beneficiadas, sendo destinada ao público participante da Jornada de Agroecologia, especialmente aos agricultores e agricultoras familiares, acampados e assentados, a base de troca, para alimentar assim um banco estadual de sementes crioulas que se perpetue entre as diferentes organizações parceiras neste grande mutirão de valorização da vida e da liberdade.
O grandioso momento de festa e celebração da colheita deu-se no dia 15 de abril, no ato público de encerramento da Jornada de Agroecologia, no Centro Chico Mendes, quando mais de 5 mil participantes partilharam 10 toneladas de sementes. Cada agricultor e agricultora, e demais participantes receberam a Sacola do Semeador, além de 2 kg de três variedades de milho, 100 gramas de uma variedade de feijão, 100 gramas de uma variedade de arroz e 30 gramas de sementes de girassol e 04 pinhões, dando início ao grande mutirão das sementes crioulas em todo o estado. Junto as sementes, recebeu ainda a carta compromisso do semeador, um folheto com orientações para assegurar a reprodução pura das sementes, e um abaixo assinado sobre o PL de Biossegurança em tramitação no Senado Federal.
José Maria Tardin: Técnico Agropecuário - Coordenador da AS-PTA – PR
André Emílio Jantara: Técnico Agropecuário – Assessor Técnico da AS-PTA – PR