Transgênicos são incógnita para a ciência
Prensa
O Globo, Brasil, 30-7-01
http://oglobo.globo.com/ciencia/632142.htm 
Transgênicos são incógnita para a ciência
A provável liberação, esta semana, do cultivo e da comercialização de soja transgênica no Brasil pelo Ministério da Agricultura acirrou as discussões sobre os alimentos geneticamente modificados. Enquanto as pesquisas desenvolvem-se com rapidez, prometendo alimentos mais resistentes a pragas, nutritivos e econômicos, ambientalistas e outros estudiosos alertam para a ausência de estudos científicos para comprovar a segurança da manipulação dos alimentos.
Proibidos no Brasil desde setembro de 1998, por uma decisão da 11 Vara da Justiça Federal, os transgênicos podem ter sua aprovação oficializada até o fim desta semana. Caso isto ocorra, a multinacional Monsanto poderá plantar e comercializar a soja Roundup Ready, cujo DNA recebeu um gene da bactéria
- capaz de manter a planta resistente ao uso do herbicida glifosato. Ou seja, o herbicida mataria as pestes sem prejudicar a saúde da planta.
- Se a Roundup Ready for aprovada, a medida será ilegal, mais uma demonstração do pouco caso com que a questão dos transgênicos é tratada no país. Como o governo cria uma lei de rotulagem, que ainda fere os direitos do consumidor, antes de os transgênicos serem aprovados no país? - indaga Silvio Valle, coordenador dos cursos de biossegurança da Fundação Oswaldo Cruz.
Valle refere-se às regras, criadas pelo governo brasileiro em julho, para a rotulagem dos alimentos transgênicos. Só produtos com mais de 4% de sua composição formada por transgênicos precisam trazer o aviso no rótulo.
- Além de ferir o Código de Defesa do Consumidor, que diz que todos têm o direito de saber o que estão consumindo, a lei é inútil porque, teoricamente, os transgênicos só podem ser cultivados no Brasil para fins de pesquisa - diz Valle.
Segundo o especialista, à medida em que estudos que comprovem a segurança dos produtos forem sendo realizados, a sua liberação será bem-vinda tanto para a economia como para a saúde dos brasileiros.
- A possibilidade, por exemplo, de se criar frutas e legumes mais resistentes e nutritivos empolga a todos. Mas o problema é o preço que será pago por isto - diz Valle.
Os testes necessários para uma eventual aprovação dos transgênicos são basicamente dois: de impacto ambiental e segurança alimentar. Mesmo nos EUA, onde os transgênicos são produzidos e exportados em larga escala, nenhuma dessas pesquisas foi considerada satisfatória pelos ambientalistas.
No Brasil, a Monsanto recebeu, em maio último, um termo de referência do Ibama para iniciar seus estudos de impacto ambiental. Mas os resultados devem demorar a chegar.
Enquanto isso, pesquisas isoladas já alertam sobre alguns riscos dos transgênicos. Um estudo realizado em Idaho, nos EUA, e publicado no "American Journal of Agronomy" mostrou que a soja transgênica produz uma proteína capaz de exterminar a bactéria
, a que fixa o gás nitrogênio no solo, essencial para o desenvolvimento da planta.
- No Brasil, esta bactéria existe naturalmente. Nos EUA, os agricultores precisam usar substâncias especiais no solo para fixar o nitrogênio. Ou seja, o que lá não traria impacto ambiental nenhum, aqui acarretaria em, no mínimo, mais despesas com a administração dessas substâncias - diz Mariana Paoli, coordenadora da campanha de engenharia genética da ONG Greenpeace.
Paoli ainda alerta para os danos que os transgênicos podem trazer à saúde humana, principalmente a elevação dos casos de alergia às proteínas produzidas por eles.
- A meu ver, assim como o Ibama irá fiscalizar o estudo dos impactos ambientais dos transgênicos, o Ministério da Saúde deveria, por intermédio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, tratar os alimentos como medicamentos. Ou seja, separando as plantações dos transgênicos (como aliás é feito na Europa) das demais, podendo assim rastrear com mais facilidade os que pudessem causar algum mal à população. Mas um processo como esse leva anos, não pode ser feito da noite para o dia - garante Silvio Valle
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