Produtor americano questiona soja transgênica
Os preços das sementes de grãos geneticamente modificados são até 56% superiores aos das convencionais nos EUA. Os Nelson são uma família da Dakota do Norte, nos EUA, que gostam de experimentar o que há de mais inovador na agricultura. Por isso, há quatro anos, estiveram entre os primeiros a testar a então recém-lançada e aguardada tecnologia das sementes de soja Roundup Ready, as cultivares geneticamente modificadas desenvolvidas pela americana Monsanto
São Paulo, 22 de Maio de 2003 - "Na época, a Monsanto dizia que a produtividade das lavouras transgênicas era maior e o uso de pesticidas, menor", recorda Rodney Nelson, 63 anos, que, junto com o pai e o irmão, cultiva cerca de 3,2 mil hectares de soja, trigo e beterraba para açúcar no condado de Amenia, em Dakota do Norte. "Plantei 30 hectares com soja transgênica em 1998 e, contrariando todas as pesquisas publicadas na época, a produtividade foi menor", diz o agricultor, que falou com a Gazeta Mercantil por telefone, enquanto preparava a terra para o plantio.
Em 1999, ele insistiu na experiência e cultivou área maior com soja geneticamente modificada: 607 hectares. Plantou, também, 810 hectares de grão não-transgênico.
Quando as colheitadeiras passaram pelo campo, ele contabilizou produtividade de 53 sacas por hectares da safra convencional, 12% superior à da área cultivada com transgênicos. "Fiquei decepcionado. Afinal, eles não diziam que a produtividade era maior?".
Outra experiência que considerou igualmente "frustrante" foi em relação ao uso de herbicidas. Para a lavoura convencional, ele pulverizou de 150 a 290 mililitros de pesticidas por hectare, contra 4,7 litros na plantação transgênica.
O agricultor desistiu de plantar transgênicos naquele ano. "Nos EUA, mais de 70% dos agricultores usam soja transgênica. Esse número fala por si só", rebate Ricardo Miranda, diretor da Monsanto Brasil.
"Há mais de mil estudos dizendo que a soja transgênica é mais produtiva e utiliza menos herbicidas", diz Miranda, que prefere não comentar o caso do agricultor Nelson por desconhecer as condições de manejo das lavouras. "Diversos estudos já comprovaram que a produtividade da soja transgênica é, em média, 5% inferior à da convencional", diz Antônio Carlos Roessing, pesquisador da Embrapa Soja. A empresa tem contrato de cooperação com a Monsanto desde 1997.
Para Roessing, a soja transgênica é ideal para ser cultivada em locais onde a infestação de ervas daninhas é severa. "Senão, não compensa economicamente", afirma.
Em casos de infestação severa, ele calcula que é possível baixar em até 10% o custo de produção utilizando sementes geneticamente modificadas. Dessa forma, o custo de produção no Brasil cairia de US$ 6 para US$ 5,40 a saca .
Para ele, o mercado de transgênicos encontra no Brasil terreno fértil. "O clima quente e úmido do Brasil favorece a infestação de ervas daninhas. Por isso, o mercado de transgênicos deve crescer aqui", acredita. "O avanço das culturas geneticamente modificadas é irreversível."
A principal vantagem da soja transgênica, diz, é em relação ao uso de herbicidas. Na soja convencional, são necessárias aplicações de agrotóxicos específicos para combater ervas de folhas largas e estreitas em diferentes estágios de crescimento. Na lavoura transgênica, por sua vez, a aplicação indiscriminada do glifosato (denominação científica do Roundup Ready) combate vários tipos de ervas sem afetar a soja. De acordo com Nelson, essa flexibilidade no manejo da lavoura é o principal atrativo da soja transgênica. "Tenho vizinhos que dizem que, apesar do alto custo da soja transgênica, o cultivo vale a pena porque o manejo é mais simplificado".
Outra característica da soja geneticamente modificada que deve ser levada em consideração é o custo da semente. A saca de 20 quilos custa US$ 67,5 nos EUA, 56,2% mais cara que os US$ 43,20 da semente convencional. No México, a semente certificada custa US$ 53,21 a saca. A transgênica é 39,2% mais cara: US$ 74,08. A Monsanto não confirma, mas correm rumores de que a saca de semente geneticamente modificada seria negociada próxima a US$ 48 no Brasil, praticamente o dobro da certificada, que custa entre US$ 23 e US$ 24.
O relacionamento de Nelson e a Monsanto não se limitou ao campo. O agricultor teve problemas com a empresa na Justiça. A companhia o acusou de guardar e replicar sementes transgênicas de um ano para o outro, violando o direito de patente. Nelson diz que não agiu de má-fé. "Pode ter ocorrido uma polinização cruzada entre a soja convencional e a transgênica." A família Nelson e a Monsanto fizeram acordo confidencial encerrando o processo.
O Brasil está na iminência de decidir se autorizará, ou não, o plantio de transgênicas. Tudo indica que, mesmo que o cultivo seja aprovado, os agricultores não terão tempo hábil para cultivá-la na safra 2003/04.
(Finanças & Mercados/Página B10)(Lucia Kassai)
Agrolink, Internet, 22-5-03