Não queremos mártires
Prensa
Brasil Online, Internet, 30-8-02
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Não queremos mártires
Por Leonardo Boff
Na véspera do Natal de 1988 no Acre, Chico Mendes foi vítima da sanha dos inimigos da natureza e da humanidade. Foi assassinado com cinco balas. Deixou a vida amazônica para entrar na história universal e no inconsciente coletivo dos que amam nosso planeta vivo e sua imensa biodiversidade. Homem marcado para morrer, recebeu proteção mínima por parte das autoridades oficiais.
Agora, nos confrontamos com outro homem marcado para morrer: o governador Jorge Viana do mesmo Acre de Chico Mendes. Então, era o latifúndio selvagem que ameaçava. Agora, somam-se o crime organizado e o narcotráfico. Armou-se uma artimanha político-judicial-criminal para viabilizar o crime, já há muito denunciado.
O primeiro passo foi buscar sua eliminação política do governador. Criou-se o pretexto de crime eleitoral. E vejam que crime: ostentar uma miniatura de castanheira, árvore soberba da selva acreana, símbolo de seu governo e da florestania, vale dizer, da cidadania do homem na floresta, extraindo benefícios dela sem depredar sua esplêndida riqueza. E não bastou àqueles juízes cassar-lhe a candidatura. Sua vontade eliminatória se excedeu a ponto de pretender torná-lo inelegível por três anos.
Assim, o caminho está aberto para o esquema criminoso vicejar como antes, na proximidade do poder, especialmente com o apoio do deputado cassado Hildebrando Pascoal, Al Capone de fundo de mato, conhecido por mandar serrar com motossera seus desafetos, e que da prisão controla o crime organizado no Estado.
Se não conseguirem a eliminação política, partirão, certamente, para a eliminação física de Jorge Viana. E não se imagine que a mente criminosa sinta qualquer constrangimento diante da opinião pública, do poder oficial ou de eventuais esquemas de segurança à pessoa do governador. A história do crime no Acre e em outros Estados revela ousadia assassina. Os criminosos contam com a cumplicidade dos setores políticos interessados: perpretam a desgraça e somem incólumes. E se presos, estão seguros da fuga acobertada e fácil.
A nação brasileira não pode aceitar essa lógica de facínoras. O Estado existe para impedir que lobos prevaleçam. Temos o direito de exigir o direito do direito. Que se faça auditoria na Justiça local para identificar possíveis conluios com o crime e não se exclua uma intervenção federal. Sobre o solo brasileiro, no campo e nas cidades, já corre sangue demais. Não queremos mártires para a exaltação da posteridade. Queremos vivas pessoas como Jorge Viana que, de peito aberto, armado só com a lei e a fé libertadora, enfrentou o crime organizado em seu próprio arraial, enviando mais de 20 criminosos para prisão.
Meu irmão Jorge, prossiga na construção da política como cuidado para com o povo acreano. A jovialidade que você irradia já criou uma aura benfazeja em todo o Estado. Confiemos na Justiça. Mas façamos nossas as palavras do salmista: ''Digna-te, ó Deus, libertar o Jorge! Apressa-te, Senhor, em socorrê-lo! Sejam humilhados e cobertos de vergonha os que atentam contra a sua vida. Recuem, cobertos de opróbrio, os que lhe desejam a desgraça'' (Salmo 70,2-3).
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