Brasil: o semifracasso da reunião em Bali

Idioma Portugués
País Brasil

RIO, 18 de dezembro de 2007 - No final, teve de tudo em Bali. A volta não prevista do secretário geral da ONU Ban Ki-moon; o choro do seu representante, Ivo de Boer; a vaia do resto do mundo para a diplomata do Departamento de Estado americano, Paula Dobriansky, a sua obstrução, depois recuo; a Índia cantando de galo na última hora e, afinal, como não poderia deixar de ser, o consenso morno em torno do mais vago denominador comum

Se a Conferência de Bali for julgada pelo seu aspecto diplomático, pode-se dizer que alcançou os objetivos para os quais fora convocada: estabeleceu o "mapa de estrada". Agora há formalmente um processo em curso para o pós-Kyoto, que antes não existia. Ele contempla inequivocamente a questão de redução de emissões de CO2 por todos, da transferência de tecnologia e das florestas como um componente fundamental. Isso comparado com a situação anterior representa um avanço.

Mas num ano de dramáticas revelações dos cientistas do painel intergovernamental para as mudanças climáticas, o IPCC, da atribuição do Prêmio Nobel a eles e ao ex-vice presidente americano, Al Gore, e de uma mobilização sem precedentes da opinião pública global havia claramente um aspecto político envolvido em Bali. Havia a expectativa de se avançar em comprometimentos mais específicos. Nesse sentido Bali fracassou.

Omissão sobre metas

Na declaração final não houve sequer aquela menção explícita à necessidade de cortar as emissões de CO2 em 50% até 2050, que a delegação brasileira pensava ser possível arrancar dos americanos, depois que eles haviam recusado a formula de 20% a 40% até 2020. Acabou não constando do documento nenhuma meta, mas uma alusão ao estudo do IPCC que define ambas como fundamentais. Se estivessem explicitamente mencionadas ainda seriam objeto de negociações, até 2009, mas o contexto político já seria outro.

Pior: não foram apenas os EUA que obstruíram essa menção explícita a metas. Tiveram o apoio da Rússia, do Canadá e do Japão. Quando ficou claro que não haveria a explicitação, a Índia, com apoio tácito da China, provocou um psicodrama de undécima hora tentando "endurecer" a parte referente à transferência de tecnologia. Passou a considerar os avanços obtidos insuficientes. Os EUA resistiram mas depois da vaia acabaram concordando pela boca de Dobriansky que, poucas horas depois, foi semi-desautorizada pela Casa Branca.

"Negócios, não caridade"

Transferência de tecnologia de redução de emissões - a famosa captura de carbono emitida por termoelétricas a carvão, por exemplo - deverá gerar patentes e isso dizia nos corredores o assessor da Casa Branca, James Counnaughton, são "negócios, não caridade".

De fato, aconteceu o que realisticamente se esperava. O único país que produziu boas notícias e acabou premiado com a presidência do processo, em 2008, foi o Brasil - embora isso não tenha merecido grande destaque, sequer na imprensa brasileira, o que dizer da internacional. A notícia de que o Brasil conseguiu reduzir suas emissões de carbono provenientes de queimadas em 14% e que passou a aceitar o princípio de fixar objetivos de redução, teria repercutido bem mais se tivesse sido vocalizado, como os ambientalistas queriam, pelo próprio presidente Lula.

Há, no final das contas, uma grande incompatibilidade entre a linguagem prolixa, detalhista ao extremo e empolada do sistema da ONU com com a era da mídia eletrônica globalizada onde as definições têm que caber em sonoras de 30 segundos de TV, ressaltadas por algum elemento simbólico visual. Já dizia o velho Chacrinha, há 40 anos: "Quem não se comunica, se trumbica". (Jornal do Brasil)

Gazeta Mercantil, Brasil, 18-12-07

 

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