Brasil: absolvição de fazendeiro é "incitação ao crime", afirma CPT
Advogado da entidade afirma que "nenhum novo fato foi acrescentado desde o primeiro julgamento realizado no último ano"
A Justiça paraense absolveu na terça-feira (6) o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bira, acusado de ser mandante do assassinato da missionária estadunidense Dorothy Stang. A decisão foi tomada pelo júri, por cinco votos a dois.
A absolvição provocou indignação. "Estou muito desapontado, mas respeito o Estado brasileiro e a opinião [do júri]", afirmou David Stang, irmão de Dorothy, que veio dos EUA. Para o advogado da CPT, José Batista Afonso, a decisão representa "uma incitação ao crime". Segundo ele, existiam provas para a condenação do mandante.
O advogado afirma que "nenhum novo fato foi acrescentado desde o primeiro julgamento” realizado em 2007. Na ocasião, o fazendeiro foi condenado a 30 anos de prisão. Bira estava no cárcere desde março de 2005 e só teve direito a um novo julgamento porque a pena do primeiro excedia 20 anos.
A reviravolta foi no caso provocada pela mudança no depoimento do pistoleiro Rayfran das Neves, acusado de executor do assassinato. Em princípio, ele argumentara que tinha matado Dorothy a mando de Bira que havia lhe entregue a arma usada no crime. Mas, na terça-feira (6), Rayfran mudou seu depoimento e assumiu individualmente a autoria do homicídio, afirmando que não houve mandante.
Para a acusação, esse depoimento foi essencial para a reviravolta do caso. O promotor Edson de Souza recorrerá da decisão. Em sua fala final, o promotor disse que a missionária, "que foi tão perseguida em vida", estava "sendo insultada depois de morta". O promotor sustentou contra Moura e Sales a acusação do homicídio qualificado, com uso de recurso que impossibilitou a defesa da vítima. Afirmou que o crime foi praticado mediante promessa de pagamento. E denunciou da tribuna que sua família está recebendo ameaças para que desista do processo. "Essas ameaças, feitas por telefonemas anônimos, estão ocorrendo há cerca de um ano", disse Souza.
Em 2005, logo após ser preso, o próprio Rayfran havia denunciado à Polícia Federal que o fazendeiro Bira lhe ofereceu R$ 10 mil para assumir a autoria do crime e inocentar Amair Feijoli da Cunha, suposto intermediário do fazendeiro Bira. Um fato que levanta muitas suspeitas é que a esposa de Cunha, Elizabeth Coutinho, afirmou em juízo que recebeu cerca de R$ 100 mil de Bida, por supostas dívidas. E nos autos do processo consta ainda a gravação de uma conversa entre os pistoleiros presos Rayfran e Clodoaldo em que comentam a oferta recebida para mudarem seus depoimentos, retirando a responsabilidade dos fazendeiros.
Um dos argumentos usados pela defesa, no novo julgamento, era o de que o réu estava sendo perseguido por causa da pressão da mídia, do governo e de ONGs internacionais. O advogado Eduardo Imbiriba chegou a acusar Dorothy de incitar a violência na região de Anapu, onde a missionária foi assassinada.
A morte de sua irmã teve repercussão internacional e se tornou um marco do conflito agrário brasileiro. Dorothy, defensora dos direitos humanos e que trabalhava em área de conflitos fundiários, foi morta a tiros em Anapu, a 300 quilômetros da capital paraense, em 12 de fevereiro de 2005. A missionária americana com os movimentos sociais no Pará havia cerca de 40 anos.
Mais ameaças de morte
Trezentas pessoas que vivem no interior do estado do Pará estão sendo ameaçadas de morte, por terem denunciado casos de tráfico de seres humanos, exploração sexual de crianças e adolescentes e pedofilia.
O número foi apresentado pelo bispo da Diocese da Ilha de Marajó (PA), dom José Luiz Azcona, em reunião extraordinária do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH). Ele é um dos quatro religiosos ameaçados de morte no estado.
Azcona afirmou que o governo do Pará, apesar de ter conhecimento do número, ainda não tomou providências para reduzir os casos. “Não me preocupa tanto a minha segurança pessoal. Se existem 300 homens e mulheres marcados para morrer, isso indica uma sociedade doente, pobre e moribunda”, criticou.
Segundo o bispo, apenas 100 dos ameaçados de morte estão sob proteção do governo federal. “Tem que ter uma mudança de mentalidade, uma conversão. [É preciso] Olhar para a Amazônia como a Amazônia é, não com os olhos de Brasília.” O bispo disse ainda que há conivência de autoridades locais em casos de “prostituição, tráfico e consumo de drogas e uso de bebidas alcoólicas entre os jovens”. (Com informações da Agência Brasil)