Brasil: a força do campo
Em Brasília, 45 organizações de povos do campo afirmam que governo prioriza o agronegócio e cobram apoio à reforma agrária
Desde domingo (23), em Brasília, 45 organizações sociais ligadas ao Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo (FNRA) fizeram um balanço das políticas do governo Lula, criticaram a prioridade dada ao agronegócio e cobraram mais apoio àpolíticas defendidas pelos povos do campo.
O evento – batizado de Encontro Nacional dos Povos do Campo: Por Justiça Dignidade e Justiça - reuniu representantes de quilombolas e indígenas, além de pequenos agricultores, trabalhadores rurais sem-terra e seringueiros. Os movimentos sociais expuseram a realidade de suas comunidades e apresentaram uma situação bem diferente das esperanças que tinham com a nova gestão. O favorecimento do agronegócio, das práticas de monocultura e das exportações foi um dos aspectos negativos ressaltados pelos povos do campo.
Ao final do evento, nesta terça-feira (25), um documento com as principais plataformas de atuação das organizações que defendem a reforma agrária e a agricultura familiar será elaborado. As deliberações ali contidas serão encaminhadas aos candidatos que concorrem no processo eleitoral em todos os níveis.
Segundo o professor titular de Geografia Agrária da Universidade de São Paulo (USP), Ariovaldo Umbelino de Oliveira, a preservação da política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso favorece o agronegócio e incentiva o latifúndio. "Esse apoio acabou recentemente expresso no refinanciamento das dívidas de grandes capitalistas. Soma-se a isso as eternas desculpas do Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra), que não consegue alcançar as metas estipuladas pelo próprio órgão", salientou, em análise feita no encontro.
Ariovaldo revelou que, hoje, existem em torno de 170 mil hectares de terras devolutas, que deveriam ser destinadas, de acordo com a nossa Constituição, para fins de reforma agrária. Mas, de cada dez processos do Incra para desapropriar terras, o órgão fracassa em sete deles e apenas três processos acabam em terras desapropriadas. "Além disso, ainda existem as terras devolutas que devem ser destinadas à reforma agrária, mas também esbarram nos entraves burocráticos e na lentidão do órgão", acrescentou o geógrafo.
Alternativas para o campo
Aberto no domingo (23), o Encontro Nacional dos Povos do Campo reuniu cerca de 300 pessoas e teve também como objetivo debater como as organizações podem se preparar para pressionar o próximo governo pela definição de uma política clara de apoio à reforma agrária.
"É preciso modificar a política econômica atual e a politica de exportação que favorecem o agronegócio, políticas essas herdadas do último governo", avalia João Paulo Rodrigues, representante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Segundo ele, sem essas mudanças, não há ruptura nas estruturas do Estado e a reforma agrária não avança.
A dificuldade de acesso à terra e a falta de cumprimento de metas pelo Incra também preocupam os quilombolas.
"O governo ainda tem uma dívida muito grande com as comunidades", avaliou Francisco Carlos, representante quilombola. Segundo ele, mesmo com a criação da Fundação Palmares, órgão ligado ao ministério da Cultura que trata do incentivo e criação de políticas públicas para a comunidade negra no Brasil, o governo não resolveu questões como a titulação de terras para remanescentes de quilombolas. "Muitos dos títulos emitidos não tem validade", denunciou.