Brasil: ¿Na contramão da "ciência, com consciência"?
Prensa
O Tempo, Brasil, 10-7-02
¿Na contramão da "ciência, com consciência"?
Por Fátima Oliveira
O governador Itamar Franco vetou a Lei Mineira sobre OGM's (Organismos Geneticamente Modificados), de autoria do deputado Edson Rezende (PT-MG), aprovada em 8 de maio de 2002. O governador cedeu ao lobby patrocinado pelas transnacionais de agrobiotecnologia e disse amém a FHC ­ um seguidista do que ordena o governo dos Estados Unidos. FHC quer legalizar o plantio e a comercialização dos transgênicos aqui, conforme o figurino Bush: sem pesquisas! E no afã de ser fiel aos EUA não hesita em nos tornar cobaias e burla os princípios de biossegurança necessários ao manejo de uma biotecnologia experimental; os requisitos da pesquisa ambiental, animal, humana e da segurança alimentar. A luta continua! Só há uma maneira de a Assembléia Legislativa provar que defende uma "ciência com consciência": derrubar o veto do governador.
Desde o início do debate público no Brasil sobre engenharia genética, em especial sobre os transgênicos, tenho escrito sobre o tema em O Tempo. Aqui publiquei o artigo: "O Suave Veneno dos Transgênicos", do qual há uma versão maior: "Afinal, qual é mesmo o suave veneno dos transgênicos?", que, surpreendentemente, viraram ícones. Perdi a conta em quantas línguas e meios de comunicação foram republicados. Tais artigos foram o ponto de partida para o meu livro: Transgênicos: o direito de saber e a liberdade de escolher ­ uma obra de divulgação e popularização da ciência, destinada às pessoas comuns que visa empoderar a sociedade para que possa decidir com conhecimento de causa sobre a ciência e o desenvolvimento científico que queremos e precisamos (Mazza Edições, BH, MG, 2000).
Conceitualmente transgênico é um animal ou vegetal que teve adicionado ao seu patrimônio genético um "gene estrangeiro". OGM é um ser vivo manipulado pela engenharia genética ­ processos de adição (transgenia); subtração (por destruição); substituição; mutagênese; e desativação de genes. Todo transgênico é um OGM, mas nem todo OGM é transgênico! A transgenia, técnica singular de engenharia genética que rompe as fronteiras entre as espécies, é germinativa: o novo padrão genético é hereditário. Um transgênico é para sempre: uma vez transgênico, transgênico até morrer!
Argumenta-se, corretamente, que a manipulação genética é tão antiga quanto a humanidade. De fato, a manipulação genética convencional, através de erros e de acertos, aquela da tradição dos hibridistas, é. A manipulação genética bioengenheirada ­ proveniente de técnicas de engenharia genética data da década de 1970. É algo que a humanidade vê pela primeira vez e ainda contém problemas científicos. O paradigma sobre o qual ela foi construída, o fatalismo genético e a estabilidade dos genes e dos genomas, é filosoficamente idealista, materialmente insustentável e, paulatinamente, está ruindo. Como têm reconhecido inúmeros cientistas, corroborando Mae Wan Ho, "genoma estável é uma abstração". É norma geral da natureza viva que meio ambiente e genes são visceralmente interdependentes e é impossível dizer qual é o mais importante.
A mídia mundial destaca que os transgênicos constituem o mais apaixonante e controverso debate mundial da genética do final do Século XX. Não sem razão, posto que a biotecnologia é o carro-chefe da economia do Século XXI, além do que há uma certeza irrefutável: a transgenia ainda é rudimentar e insegura e deve ser regulamentada, já que os cientistas chamados engenheiros da vida ­ os "engenheiros genéticos" ­ ainda não dominam os processos biotecnológicos pelos quais se fabrica um transgênico, pois inserem o transgene no organismo hospedeiro "às cegas". Ou seja, ainda não sabem colocá-lo no lugar que precisam para resultar no que desejam. Isto é, se ocorrerem erros ninguém sabe se haverá um amanhã para repará-los.
Na contramão da história e da ciência com responsabilidade, FHC e o governador não se importam com o recrudescimento das dúvidas cientificas sobre engenharia genética, o que levou à União Européia (UE), em 3 de julho de 2002, a aprovar uma lei obrigando a rotulagem de todos os alimentos OGM's ou que contenham derivados deles. Tal lei será apreciada pelos ministros europeus do Meio Ambiente e revogará a atual, que obrigava a rotulagem apenas dos alimentos com mais de 1% de OGM.
Há um caso recente que é exemplar. Pesquisadores da Universidade de Purdue (Indiana, EUA), pretendiam fabricar um tomate transgênico que demorasse a amadurecer. Usaram um gene de levedura. O resultado foi a criação, acidental, de um tomate que possui duas a três vezes mais licopeno ­ substância que dá a cor vermelha ao tomate. Especula-se que o licopeno talvez diminua no sangue as taxas do "colesterol ruim", o que concorreria para diminuir os riscos de doenças cardiovasculares e de acidentes vasculares cerebrais (o popular "derrame"); e que talvez evite a degradação celular ­ um estágio favorável ao aparecimento de tumores malignos (câncer). Em bom nordestinês: espiem e vejam a ignorância e a insegurança! Tal erro foi divulgado com a seguinte manchete: "Tomate transgênico ajudaria a evitar o câncer". Tudo no terreno das hipóteses! O maior sucesso da engenharia genética continua sendo as promessas.
Fátima Oliveira escreve no Magazine às quartas-feiras.
E-mail: rb.moc.gi@arieviloamitaf
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