Brasil: extrativistas pedem maior participação na gestão de seus territórios
Os participantes do 1° Encontro de Lideranças das Reservas Extrativistas e de Reservas de Desenvolvimento Sustentável, ocorrido em Brasília na semana passada, enviam carta ao Presidente Lula na qual elogiam a criação de Unidades de Conservação de Uso Sustentável, mas pedem maior participação da sociedade civil na gestão das Resex e RDS e a permanência de Marina Silva no Ministério do Meio Ambiente
Ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Nós, participantes do 1° Encontro Nacional de Lideranças das Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável temos participado do forte avanço na política de criação de unidades de conservação de uso sustentável. No primeiro mandato do presidente Lula foram criadas 21 unidades beneficiando 19.815 famílias, representando 4.984.267 ha, - bem como a tipificação de novas modalidades como os PDS (Projeto de Desenvolvimento Sustentável) criado pelo INCRA. Essas iniciativas promovem forte impacto socioambiental, pois de imediato vem solucionar graves disputas fundiárias que colocam em risco a vida de famílias de pequenos produtores agroextrativistas, consolidando o mecanismo de reforma agrária mais apropriado para as populações tradicionais. Esses avanços vêm sendo consolidados em estratégias de planejamento de Estado, tendo como exemplo o Plano Nacional de Áreas Protegidas, instrumento fundamental para pactuação das metas que permitirão ao país reduzir a perda da biodiversidade, por meio da consolidação de um sistema ampliado de áreas protegidas.
Outro grande avanço obtido pelas populações tradicionais no governo Lula, foi a discussão e formatação da Política Nacional para o Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, que além de reconhecer a diversidade das demandas desse segmento, garante sua proteção quanto a impactos decorrentes de grandes obras de infra-estrutura e condições adequadas para sua inclusão política, socioambiental e econômica, tendo inclusive criado a Diretoria de Desenvolvimento Socioambiental no IBAMA e a Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Povos e Comunidades Tradicionais.
Cabe também mencionar outras iniciativas governamentais que estão sendo implementadas nas Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável, recuperando uma dívida histórica do Estado brasileiro junto às populações tradicionais.
Uma família que nunca soube o que era sentar no banco de uma escola, hoje está tendo acesso a educação de nível médio e em alguns casos até o ensino profissionalizante e superior. O programa Luz para Todos e os programas de inclusão digital e saneamento tem possibilitado mudanças significativas na qualidade de vida das comunidades, especialmente para a juventude.
No setor produtivo não podemos deixar de destacar a inclusão das RESEX e RDS como beneficiárias do Programa Nacional de Reforma Agrária, facilitando o acesso ao crédito e assistência técnica, bem como o Programa de Aquisição de Alimentos da CONAB, importante instrumento para comercialização da produção familiar. Iniciativas de industrialização da produção agroextrativista como no caso da indústria de piso de madeira e de preservativo masculino, ambas no Estado do Acre, têm gerado emprego e perspectiva de dias melhores para muitas comunidades.
Portanto não podemos negar o esforço do governo de Vossa Senhoria em construir um "Brasil país de todos", mas não podemos deixar de destacar problemas advindos dessa caminhada. Na busca de criar novas relações mais democráticas entre governo e sociedade civil, foram implementadas Conferências Nacionais, Consultas Públicas, Conselhos Deliberativos, Fóruns, etc, instrumentos muito importantes para ampliação da participação popular nos processos de decisão.
Destacamos especialmente nesse processo o 1° Encontro de Lideranças das Reservas Extrativistas e de Reservas de Desenvolvimento Sustentável - processo que sugerimos tenha periodicidade anual.
Porém, na construção desse mecanismo, foi esquecido o papel fundamental das organizações de âmbito nacional e regional, envolvidas no contexto de consolidação da política socioambiental.
Organizações históricas como o Conselho Nacional de Seringueiros, Grupo de Trabalho Amazônico e Movimento Nacional dos Pescadores além das associações comunitárias de moradores e usuários das RESEX e RDS, foram praticamente esquecidas no processo de construção de estratégias voltadas para a promoção do modelo de co-gestão governo - sociedade civil presente nas RESEX e RDS.
É necessário a pactuação de uma agenda programática com essas instituições, que tem um papel fundamental na construção do capital humano, que por sua vez qualifica os mecanismos de consulta popular. Essas instituições são fundamentais para a consolidação da política de gestão para as Reservas Extrativistas e Reservas de Desenvolvimento Sustentável, pois entendemos que essa relação vai além da disponibilização de recursos orçamentários, devendo também definir como e de que forma aplicá-los.
Além disso, é imprescindível dar escala as iniciativas envolvendo a totalidade de RESEX e RDS criadas e iniciar o processo naquelas em que já existe a demanda para sua criação, pensando em mecanismos que universalizem as ações governamentais de grande impacto socioambiental nessas Unidades de Conservação. Para isso é necessário fortalecer as estruturas da Diretoria de Desenvolvimento Socioambiental do IBAMA bem como o CNPT, responsáveis por esse processo.
Finalmente, não podemos deixar para mais tarde o debate sobre uma legislação específica que reconheça as diversidades das instituições do terceiro setor, no reconhecimento do serviço que prestam ao Estado e formas mais adaptadas para o estabelecimento de cooperação financeira e técnica.
Concluímos essa carta senhor presidente, sugerindo que seja mantida a política implementada pelo Ministério do Meio Ambiente, com os ajustes mencionados, bem como, a continuidade da ministra Marina Silva para o próximo mandato.