Abelhas estão desaparecendo no sul do Brasil
Apicultores gaúchos e catarinenses relatam desaparecimento de abelhas em níveis inéditos. Alguns produtores registram perdas de 25% na produção de mel. Pesquisador diz que uma das causas do fenômeno pode ser a influência de lavouras transgênicas
Porto Alegre, RS - As primeiras notícias sobre o fenômeno do desaparecimento das abelhas foram recebidas como uma espécie de enredo de um novo filme de ficção científica. Mas o problema tornou-se muito real. Nos Estados Unidos recebeu o nome de Colony Collapse Disorder (Desordem e Colapso da Colônia). Agora, o problema foi detectado também no Brasil, particularmente em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul.
Matéria publicada no jornal Diário Catarinense, de Florianópolis, afirma que o desaparecimento das abelhas já é motivo de grande preocupação entre apicultores dos dois Estados. E o desaparecimento vem acompanhado de outro problema: as abelhas que permanecem nas colméias estão morrendo infectadas por diversas doenças. Em depoimento ao jornal, o apicultor e pesquisador Leandro Simões, de Campo Alegre, diz que nunca viu algo parecido em 35 anos de profissão.
O fenômeno pode causar graves desequilíbrios ambientais, uma vez que as abelhas são responsáveis por mais de 90% da polinização e, de forma direta ou indireta, por 65% dos alimentos consumidos pelos seres humanos. Alguns produtores já registram perdas de 25% na produção de mel.
Segundo Jair Barbosa Júnior, do Instituto de Estudos Socioeconômicos, com sede em Brasília, uma das possíveis causas do fenômeno pode ser a influência de lavouras transgênicas. No Brasil, lembrou Barbosa, não há estudos aprofundados sobre o impacto dos transgênicos no ecossistema. Outra possível causa apontada pelo pesquisador é o aquecimento global. O sistema de orientação das abelhas funciona por meio dos olhos. As abelhas dependem da luz solar para encontrar o caminho de volta para as colméias. O aumento da incidência de raios ultravioletas poderia, assim, ser uma das causas do fenômeno. Essa possível causa não explica, porém, o que está atingindo o sistema imunológico dos animais.
A advertência de Einstein
O físico Albert Einstein disse que se as abelhas desaparecessem, a humanidade seguiria o mesmo rumo em um período de 4 anos. A razão é muito simples: sem abelhas não há polinização, e sem polinização não há alimentos. O desaparecimento das abelhas começou a ser tema na mídia em 2006, nos EUA e no Canadá, quando criadores que alugam enxames para agricultores começaram a relatar o desaparecimento destes animais em níveis muito elevados.
Em várias regiões destes dois países, apicultores chegaram a perder 90% de suas colméias. O biólogo norte-americano Edward Wilson, chamou o fenômeno de "o Katrina da entomologia", numa referência ao furacão que arrasou Nova Orleans, nos EUA.
Na Califórnia, entre 30% e 60% das abelhas desapareceram. Em algumas regiões da costa leste dos EUA e do Texas, esse índice chegou a 70%. Segundo o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), o fenômeno foi registrado em 42 estados norte-americanos e duas províncias canadenses. A redução das colônias de abelhas no país vem ocorrendo, pelo menos, desde 1980. De acordo com dados do USDA, o número de colméias hoje nos EUA (2,4 milhões) é 25% do que aquele que existia em 1980.
Já segundo a Associação de Apicultura Americana, o desaparecimento das abelhas atingiu 30 estados dos EUA. A morte repentina de abelhas também já foi registrada em países como Alemanha, Suíça, Espanha, Portugal, Itália e Grécia. Manfred Hederer, presidente da Associação Alemã de Apicultores, relatou uma queda de 25% nas populações de abelhas por toda o país.
Transgênicos entre os suspeitos
Entre as possíveis causas do fenômeno, são citadas a radiação de telefones celulares, o uso indiscriminado de herbicidas e o uso de transgênicos, em especial os do milho Bt (com gene resistente a insetos; contém pedaços do DNA da bactéria Bacillus thuringiensis).
Diversos países proibiram, recentemente, variedades transgênicas do tipo Bt, o segundo transgênico mais plantado hoje no mundo (fica atrás apenas da soja). O governo peruano proibiu a variedade da batatinha transgênica Bt, em razão do país ser o centro de origem e biodiversidade desta cultura. O México proibiu totalmente o plantio ou consumo do milho Bt pelas mesmas razões. O governo da Grécia tomou a mesma decisão, estendendo a proibição a 20 variedades do milho Bt, por risco de ameaça à espécie humana, à vida silvestre e à indústria de criação de abelhas. O Brasil, por sua vez, vem aprovando a liberação de transgênicos Bt.
Outra hipótese levantada relaciona o problema à radiação dos telefones celulares. O jornal inglês The Independent publicou matéria a respeito, afirmando que a radiação dos celulares poderia estar interferindo no sistema de navegação das abelhas, provocando a desorientação das mesmas, que, assim, não conseguiriam mais voltar para suas colméias. Além disso, citou pesquisas alemãs que apontaram mudanças de comportamento das abelhas nas proximidades de linhas de transmissão de alta tensão.
Ainda não foi encontrada nenhuma prova sobre a real causa do problema. A possibilidade de uma praga causada por algum produto químico é questionada pelo fato de que não são encontrados restos mortais das abelhas em grande número. Quando uma colônia é afetada por algum microorganismo, há muitos insetos mortos em torno delas. Nos casos relatados nos EUA e em outros países, as abelhas simplesmente estão desaparecendo.
Alguns cientistas, por outro lado, minimizam o problema. O professor emérito de entomologia da Oregon State University, Michael Burgett, disse ao jornal The New York Times que as grandes baixas em abelhas em algumas regiões poderiam simplesmente ser um reflexo de picos populacionais superiores à taxa normal de mortalidade em décadas recentes. Segundo ele, no final dos anos 70 houve um fenômeno similar a este, que, na época, foi chamado de "doença do desaparecimento". Não foi encontrada uma causa específica para o desaparecimento.
Mas não se trata de uma simples repetição. A novidade é que, desta vez, o problema está aparecendo ao mesmo tempo em várias regiões do planeta, inclusive no Brasil.
por Marco Aurélio Weisheimer - Agência Carta Maior
EcoAgência, Internet, 26-08-07