A América Latina aumenta suas exportações de recursos naturais
O comércio exterior da América Latina não somente não conseguiu romper a dependência das exportações de matérias-primas, ou seja, de recursos materiais, como esta se acentua, alentada por fatores, tais como: a crise econômico-financeira, os altos preços das commodities e o insaciável importador asiático
A reportagem é de Eduardo Gudynas e está publicada em seu blog Acción y Reacción, 21-01-2011. Gudynas é pesquisador do Centro Latino-Americano de Ecologia Social. A tradução é do Cepat.
O anuário estatístico da CEPAL, apresentado semanas atrás em Santiago do Chile, mostra esta tendência com indicadores sistematizados em 2009. Na Comunidade Andina, a porcentagem de produtos primários no total de exportações voltou a aumentar (passou de 81% em 2008 para 82,3% em 2009); e no Mercosul o salto foi maior (de 59,8% para 63,1%).
Os países andinos mostram a maior “primarização” de suas exportações, na ordem de 90% (são os casos da Bolívia, Peru, Equador e Chile – e seguramente também a Venezuela, ainda que este país não tenha dados sistematizados). Os dados preliminares para 2010 concordam com esse quadro. Além disso, a tendência é aprofundar esta dependência. Por exemplo, na Bolívia, nos últimos cinco anos, a participação de bens primários passou de 89,4% em 2005 para quase 93% agora. Ou seja, quer seja um governo progressista, como o de Evo Morales, ou um conservador, como Alan García, nos últimos anos, a primarização aumentou.
Mas, a mesma coisa ocorre no Brasil, um país que é apresentado como um sucesso econômico, mas que na realidade esconde várias contradições que os analistas internacionais não assinalam. Por exemplo, durante os dois mandatos consecutivos de Lula, a participação dos bens primários nas exportações passou de 48,5% em 2003 para 60,9% em 2009. A ideia de um Brasil industrializado deve ser analisada com cautela, já que esse Governo segue aprofundando as exportações de recursos naturais. Portanto, haveria que considerar com cuidado se a estratégia econômica e produtiva de Lula é realmente um exemplo a ser imitado.
Nos últimos dias foram divulgados dados referentes ao Uruguai, e a situação é essencialmente a mesma: a primarização aumentou e o país está se desindustrializando.
As tentações para seguir esta estratégia primarizadadora são enormes. A demanda internacional é forte (especialmente por parte da Ásia), os preços são atrativos (em 2010 aumentaram 28% em relação a 2009 para os agroalimentos, 30% nos minerais, segundo a UNCTAD, e o preço do petróleo continua em alta). Como se fosse pouco, em vários países esses setores permitem captar ingressos fiscais suculentos.
Mas, sob essa estratégia, o objetivo do desenvolvimento nacional, como “desenvolvimento endógeno”, se perde; a autonomia frente aos mercados globais se desvanece. As indústrias nacionais não se recuperam, em vários casos há um processo de desindustrialização. No passado, em vários países a esquerda acusava a direita de favorecer as importações de bens de consumo dos Estados Unidos ou da Europa; atualmente, várias esquerdas nos governos se entretêm com importações da Ásia. Para comprar esses automóveis ou eletrodomésticos cada vez se exportam mais minerais ou mais soja. Os destinos do comércio internacional estão mudando, mas a assimetria entre a venda de bens primários e a compra de manufaturas, se mantém.
Sob esse estilo de desenvolvimento, o emprego gerado é insuficiente, a produtividade é suplantada por maiores volumes exportados. Ingenuamente, se espera que a pobreza se reduza em consequência das exportações. Antes se festejava a globalização e hoje se duvide dela, mas esperar que as exportações de matérias-primas resolvam todos os nossos problemas é ingenuidade e carece de fundamentação. Continua sendo necessário gerar estratégias de desenvolvimento endógenas e autônomas.