Em 90% do Brasil, mudanças no clima reduzirão abelhas e afetarão alimentos
"Precisamos entender melhor essas relações entre polinizadores e culturas agrícolas para preparar programas de conservação. As abelhas e polinizadores são prioritários. Se esses cenários se confirmarem, ficaremos em uma situação muito complicada quanto à produção de alimentos, diz Giannini".
Na prateleira dos mercados, feijão, abacate e aquecimento global –que irá impactar animais polinizadores e, consequentemente, os alimentos dependentes deles. No Brasil, cerca de 90% das cidades (entre as 4.975 que foram analisadas) sofrerão redução no número de abelhas, importantes para a polinização.
Os pesquisadores se concentraram em 13 culturas agrícolas que possuem robusta base de dados, ou seja, com determinações sobre produtividade, localização, dependência de polinizadores e polinizadores efetivos –fatores com efeito real para polinização.
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"Temos uma carência gigantesca de dados. Não sabemos quantas culturas existem no Brasil, mas devem ser centenas", afirma Tereza Giannini, autora do estudo e pesquisadora do Instituto Tecnológico Vale.
Ao todo, o Brasil tem 5.570 municípios, de acordo com o levantamento mais recente do IBGE, dos quais 4.975 foram analisados. Os que ficaram de fora da análise, não possuem dados sobre a produção ou realmente não têm as culturas estudadas: acerola, abacate, feijão, coco, café, algodão, goiaba, tangerina, maracujá, caqui, girassol, tomate e urucum.
Giannini afirma que alterações nas produções de espécies com alto valor de produção, como café e algodão, podem ter impactos significativos na economia. Estudos anteriores calculam que as mudanças climáticas podem custar entre US$ 4,9 bilhões (R$ 16,6 bi) a US$ 14,6 bilhões (R$ 49 bi) para o Brasil.
A pesquisa levou em conta as 95 espécies de abelhas relacionadas às plantações estudadas. Segundo Giannini, em média no país, haverá uma redução de 13% na ocorrência desses animais.
Contudo, essa taxa tem grande variação pelo país e os municípios mais afetados ficam no Sul e Sudeste, com risco de redução de polinizadores de até 60%. As plantações de girassol e tomate de cidades de Minas Gerais seriam as que mais sentiriam a redução. Antonio Saraiva, cientista da USP e um dos responsáveis pelo estudo, afirma que as conclusões da pesquisa trazem "as mudanças climáticas para o bolso e para a barriga das pessoas".
"Ter perda ou deslocamento dos polinizadores afeta a produção. Isso causa impactos em empregos e na renda local, e nos preços dos produtos pela diminuição da oferta", afirma Saraiva, que ressalta que a questão dos preços não foi tratada nas análises.
De forma geral, as produções de goiaba, tomate, café e tangerina serão as mais afetadas.
Para dimensionar o impacto do aquecimento global na ocorrência de abelhas, a pesquisa considerou um aumento de temperatura de 2°C a 4°C até 2050 –seguindo dados do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, da ONU).
"Precisamos entender melhor essas relações entre polinizadores e culturas agrícolas para preparar programas de conservação", diz Giannini. "As abelhas e polinizadores são prioritários. Se esses cenários se confirmarem, ficaremos em uma situação muito complicada quanto à produção de alimentos."
Uma forma de, pelo menos, amenizar a redução e migração de polinizadores seria, a partir de mais plantas amigáveis às abelhas, disponibilizar outras fontes de alimento e ninho. "Isso pode ser feito de maneira a não impactar muito as atividades humanas", diz Saraiva.
O pesquisador da USP afirma que espécies vegetais que produzam néctar e pólen podem ser plantadas em faixas de terra não utilizadas e em beiras de estrada. Em meio a plantações, poderiam ser cultivadas plantas que proporcionem alimento para as abelhas mas que não provoquem competição por nutrientes.
"A outra opção é rever áreas destinadas à agricultura e, eventualmente, aumentar as regiões de matas preservadas", afirma Saraiva. O estudo foi publicado nesta quarta-feira (9), na revista científica "Plos one".