Brasil: Vitória indígena no STF

Idioma Portugués
País Brasil

Por oito votos a zero, ministros rejeitam ação do governo de Mato Grosso que negava ocupação tradicional indígena e pedia indenizações.

Os povos indígenas obtiveram uma vitória importante no Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quarta (16/8). A corte rejeitou as duas ações do governo de Mato Grossoque exigiam indenizações da União por ela ter supostamente demarcado o Parque Indígena do Xingu e áreas dos índios Pareci e Nambikwara sobre áreas devolutas estaduais.

O resultado final foi incontestável: todos os ministros presentes acompanharam o voto do relator, Marco Aurélio Mello, contra as ações. O placar final ficou em oito votos a zero a favor do relatório.

Conforme a decisão final, o STF confirmou definitivamente a ocupação tradicional em toda a extensão do Parque Indígena do Xingu, das Terras Indígenas (TIs)Nambikwara, Salumã e Tirecatinga, do povo Nambikwara, e Pareci e Utiariti,do povo Pareci. Portanto, não cabe nenhuma indenização ao Estado de Mato Grossopela demarcação das áreas.

“O STF decidiu que, em nenhum momento, essas terras passaram ao Estado do Mato Grosso e que não é possível ignorar a presença dos índios”, comemorou, ao final do julgamento, Luís Enrique Eloy, indígena terena e advogado da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).

Marco temporal:

O temor do movimento indígena e das organizações indigenistas era que alguns ministros tentassem usar os dois casos para discutir restrições aos direitos territoriais indígenas diante das pressões de ruralistas e do governo Temer.

Um dos receios era de que o chamado “marco temporal” fosse incluído no debate. Segundo essa tese, defendida por alguns ministros e juízes de instâncias inferiores, só pode ser considerada TI a área ocupada pelos índios em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. O marco não leva em conta expulsões sofridas pelas comunidades indígenas e dificulta as demarcações.

Não houve nenhuma decisão sobre o tema. O ministro Luís Roberto Barroso deixou claro que os dois casos não colocavam em questão o assunto. “Não se trata de uma discussão que envolva o marco temporal”, disse Barroso. Ele reafirmou que as determinações da decisão, de 2009, sobre a TI Raposa-Serra do Sol (RR) – na qual foi definido o “marco temporal” – devem ser aplicadas somente para esse caso. “Entendo que somente será descaracterizada a ocupação tradicional indígena se os índios deixarem voluntariamente a área ou os laços culturais forem desfeitos”, mencionou.

Em julho, o governo Temer adotou um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) que determinou a aplicação das condicionantes do caso Raposa-Serra do Sol a todos os processos de demarcação de TIs, o que deve paralisá-los de vez e pode implicar a revisão de vários deles.

Luís Enrique Eloy avalia que a decisão de hoje é um recado do STF ao Executivo e ao Legislativo em defesa do direito originário dos índios sobre suas terras e que ele não deve ser flexibilizado em nome de interesses econômicos.

Eloy também avalia que a decisão foi desfavorável à consolidação da tese do “marco temporal”. Ele lembrou que alguns ministros mencionaram normas que, desde a época da Colônia e ao longo dos séculos seguintes, confirmaram o direito dos índios sobre suas terras. “Não é possível afirmar que essa discussão foi encerrada, mas os ministros deram uma sinalização clara de que os marcos temporais para a comprovação da posse da terra indígena não começam em 1988”, aponta.

Na noite de ontem, foi retirada da pauta do STF a ação da Fundação Nacional Indígena (Funai) que pede a anulação dos títulos de propriedade de imóveis rurais concedidos pelo Estado do Rio Grande do Sul sobre essa TI Ventarra, dos Kaigang, no Rio Grande do Sul. Nesse caso, o risco da imposição do “marco temporal” era maior ainda, conforme as organizações indígenas e indigenistas. Segundo informações, as partes envolvidas pediram para reanalisar o processo.

Decreto quilombola retirado de pauta:

Também foi retirada de pauta a retomada do julgamento sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3.239, proposta, em 2004, pelo então PFL, hoje DEM,contra o Decreto 4.887/2003, que regulamenta a demarcação dos quilombos atualmente. O ministro que deveria votar logo no reinício do julgamento, Dias Toffoli, teve um problema de saúde e não pode comparecer ao tribunal.

Quilombolas e seus apoiadores defendem a norma e também temem que o STFdeclare sua constitucionalidade, mas restringindo o direito das comunidades à terra, ou sua inconstitucionalidade. Nesses dois casos, procedimentos de demarcação em andamento e futuros podem ser prejudicados ( saiba mais).

“Convocamos toda a sociedade brasileira a continuar acompanhar o julgamento e defendendo os territórios quilombolas, que são um patrimônio do Brasil”, disse Givânia Silva, da direção da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).

A Conaq e organizações parceiras, como o ISA, lançaram a campanha O Brasil é Quilombola! Nenhum Quilombo a menos! em defesa do decreto. A petição divulgada pela mobilização já tem mais de 70 mil assinaturas.

- Foto por Mídia Ninja.

Fonte: Instituto Humanitas Unisinos - ADITAL

Temas: Pueblos indígenas, Tierra, territorio y bienes comunes

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