Atingidos pelo crime de Mariana ocupam ferrovia da Vale no ES por reparações
Principal reivindicação é contratação de assessorias técnicas para avaliar danos causados pelo rompimento de Mariana
Pescadores, ribeirinhos, agricultores e comerciantes atingidos pela mineradora Vale ocuparam, na manhã desta segunda-feira (1º), a Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), no Espírito Santo, um dos principais pontos de escoamento da mineradora porque liga a produção no estado de Minas Gerais ao Porto de Tubarão, no estado capixaba. A empresa tem uma filial na região
O trancamento, que mobilizou cerca de 250 pessoas, ocorre na altura do bairro Carapina, no município de Serra. Eles reivindicam a contratação imediata das entidades de assessoria técnica que avaliam os processos reparatórios dos danos do rompimento da barragem do Fundão, em Mariana (MG). A tragédia, no dia 5 de novembro de 2015, deixou 19 mortos e atingiu também a região.
Assessorias técnicas já foram realizadas em Mariana, Barra Longa e o território dos municípios de Santa Cruz Escalvado e Rio Doce, lugares afetados imediatamente pela lama. No entanto, o direito de assessoria técnica para outros 18 territórios, localizados ao longo da Bacia do Rio Doce, foi acordado em um termo separado, o termo aditivo do Termo de Ajustamento Preliminar (TAP) no dia 16 de novembro de 2017. O documento foi assinado pelo Ministério Público Federal (MPF), o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e pelas empresas Samarco, Vale e BHP Billiton.
Apesar de já terem sido escolhidas as entidades que vão conduzir o processo em nove locais no Espírito Santo e nove em Minas Gerais, nenhuma foi efetivada de fato.
Segundo Heider Boza, integrante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), os atingidos aguardam a efetivação dos contratos desde dezembro de 2018. Segundo ele, a definição das assessorias é importante para subsidiar as ações para qualificar as negociações por indenizações.
"Atualmente, elas são muito desleais. A fundação Renova com todo seu arsenal de técnicos, laudos e peritos negociam com atingidos que não tem nada além de si mesmo e da sua palavra, contra a palavra de técnicos e engenheiros", explica o militante.
"Esse tipo de desastre não tem precedente e tem proporções inéditas na história do Brasil, do ponto de vista dos impactos nas cadeias econômicas, nos modos de vida, hábitos e na saúde das pessoas, que têm contatos com alimentos contaminados e por partículas de metais nas águas que estão sendo consumidas", continua Boza.
Após a assinatura do termo aditivo do TAP, em 2017, o Fundo Brasil de Direitos Humanos (FBDH) e a Fundação Getúlio Vargas (FGV) passaram a atuar no território como especialistas do MPF para acompanhar a contratação da assessoria técnica e garantir o direito de participação dos atingidos e atingidas.
Na última sexta-feira (28), as empresas assinaram a renovação dos contratos das FBDH para continuidade dos trabalhos de coordenação das assessorias.
"Isso é um passo importante porque sem o contrato do Fundo Brasil de Direitos Humanos, não é possível contratar as assessorias. Para garantir a questão da assessoria técnicas, que ela seja independente de fato, inclusive em termos jurídicos, não pode haver vínculos da entidade de assessoria com a empresa Vale, que é quem vai pagar", pontua Boza.
O FBDH vai atuar como coordenadora das entidades e receptora dos recursos das mineradoras. Mas o plano de trabalho do fundo ainda não foi definido. Os movimentos temem que, com prazos prolongados, as assessorias não sejam contratadas até o final deste ano.
O militante compara com a situação em Brumadinho. Mesmo tendo acontecido quase três anos após a tragédia de Mariana, os reparações e assessorias estão em um estágio mais avançado.
“Lá tem um juiz que é diferente do juiz do nosso caso e ele está impondo um ritmo de trabalho à empresa.”
Entre as pesquisas conduzidas por especialistas do MPF, como a Ramboll, nos territórios em que já assessoria técnicas, foi constatada a desigualdade de reconhecimento entre homens e mulheres e a ineficiência dos programas da Renova.
Pesquisas contratadas pelas câmaras técnicas também apontam a contaminação de peixes e plantas. Apenas um mês após o rompimento em Mariana, foram retiradas 11 toneladas de peixes mortos, oito em Minas e três no Espírito Santo.
Durante o protesto, uma comissão de representantes da empresa foi ouvir as propostas dos atingidos, mas ainda não foi dada uma resposta às reivindicações do movimento.
O Brasil de Fato entrou em contato com a Vale, que informou que “está acompanhando as tratativas com as comunidades, como uma das signatárias do Termo de Transação de Ajustamento de Conduta (TTAC) firmado entre entidades públicas e privadas”. A empresa fala em 60 manifestantes.
Até o início da tarde desta segunda-feira, os militantes permaneciam bloqueando a entrada da empresa e estrada em Carapina.
Edição: Pedro Ribeiro Nogueira
Fuente: Brasil de Fato