Soluções baseadas na natureza, ou seduções baseadas na natureza?
"Soluções baseadas na natureza" (SbN) é um termo amplamente utilizado mas vagamente definido. Significa uma série de coisas para diferentes pessoas, incluindo muitas acções e abordagens positivas, tais como a agroecologia e a restauração dos ecossistemas. Mas um grupo de actores está a utilizar o termo para impulsionar uma agenda específica relacionada com a biodiversidade e as alterações climáticas, cuja compreensão é essencial para compreender a política actual em torno do SbN. Este resumo descreve essa agenda e a forma como o SbN é utilizado dentro dela.
Uma análise do perigoso mito de que as soluções baseadas na natureza são suficientes para mitigar as alterações climáticas
A Rede do Terceiro Mundo (Third World Network, TWN) e o Centro Africano para a Biodiversidade (African Centre for Biodiversity, ACB) têm o prazer de partilhar convosco um novo documento de briefing.
Origens, distorções e mitos
Em 2016, a União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) introduziu o termo “soluções baseadas na natureza” no discurso global sobre a conservação. A UICN define as “soluções baseadas na natureza” como “ações para proteger, gerir de forma sustentável e restaurar os ecossistemas naturais ou modificados, abordando os desafios sociais de forma eficaz e adaptativa, de modo a proporcionar simultaneamente benefícios para o bem-estar humano e para a biodiversidade”.
Num aprofundamento recente, a organização faz referência a sete desafios que precisam ser abordados pelas SbN: mitigação e adaptação às alterações climáticas, redução do risco de catástrofes naturais, desenvolvimento económico e social, saúde humana, segurança alimentar, segurança no acesso à água e reversão da degradação dos ecossistemas e da perda de biodiversidade.
Embora as suas origens residam em debates políticos mais alargados em torno da conservação da natureza, mais recentemente a discussão sobre as SbN tem-se centrado no desafio das alterações climáticas e em como tais soluções podem contribuir para a mitigação, adaptação e redução do risco de catástrofes. Entre essas áreas, a mitigação das alterações climáticas é a que tem recebido maior atenção. Essa atenção ganhou ímpeto com a publicação de um artigo científico de 2017 sobre “Soluções Naturais para o Clima”, que defendia que essas soluções — através da redução das emissões dos ecossistemas naturais e agrícolas ou de um maior sequestro de carbono pelos mesmos — poderiam contribuir com mais de um terço dos esforços globais de mitigação necessários até 2030. Embora essa constatação em particular tenha uma aplicação limitada, o valor de 37% é muito citado como a possível contribuição das soluções baseadas na natureza para mitigar as alterações climáticas.
Um estímulo adicional, e provavelmente mais significativo, para a atenção dada às SbN é o mito de que o sequestro de carbono pela natureza poderia contrabalançar (ou, nos termos técnicos do mercado de carbono, compensar) a queima incessante de combustíveis fósseis. Este é um mito particularmente perigoso se quisermos alcançar o objetivo do Acordo de Paris de limitar o aumento da temperatura média global a bem menos de 2°C e manter os esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais.
A ciência sobre o tema é extremamente clara — para alcançar esse objetivo será necessário descarbonizar as nossas sociedades e também aumentar as capacidades de remoção e fixação de carbono nos ecossistemas do planeta ao longo das próximas décadas. A descarbonização exige que deixemos de utilizar combustíveis fósseis (carbono) para mover as nossas economias.
Já não resta tempo para permitir que alguns continuem a queimar combustíveis fósseis enquanto se espera que a natureza, de alguma forma, “compense” essa queima.
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