Brasil: passados dois anos do massacre de cinco sem-terra, ameaças continuam

Idioma Portugués
País Brasil

Missão da Relatoria Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada, Água e Terra Rural da Plataforma DHESCA Brasil confirma denuncias de ameaças contra famílias do MST em Felisburgo (MG), dois anos depois do massacre que vitimou cinco sem terras

De acordo com a Relatoria, situação fundiária não foi solucionada e governo estadual tem dificultado indenização de familiares das vítimas.

Completados dois anos do ataque de pistoleiros a um acampamento do MST que vitimou cinco pessoas e deixou 17 feridos em Felisburgo, MG, trabalhadores sem-terra que continuam acampados na área que gerou o conflito com o mandante do crime, o fazendeiro Adriano Chafick, voltam a denunciar ameaças de morte por parte de pistoleiros supostamente a serviço do fazendeiro.

Nos dias 16 e 17, o Relator Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada, Água e Terra Rural da Plataforma DHESCA (Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais), Flávio Valente, esteve no local para verificar a situação dos acampados e participou, na Assembléia Legislativa de Belo Horizonte, de uma audiência pública com autoridades estaduais e federais ligadas à questão, como o Instituto de Terras do estado, o Incra e o Ministério do Desenvolvimento Agrário.

Segundo Valente, que colheu depoimentos de vários sem-terra, as ameaças de morte denunciadas têm fundamento e assemelham-se muito às feitas antes do ataque dos pistoleiros em 2004. Para o relator, o problema agravou-se com a soltura de Adriano Chafick em abril de 2005 – réu confesso, o fazendeiro foi preso e posteriormente beneficiado por dois hábeas corpus concedidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

“A soltura de Chafick reforçou um sentimento de impunidade entre os pistoleiros. Tem sido comum que os acampados sejam parados na rua, dizem-lhes que a situação não vai ficar assim, que eles serão expulsos”, diz Valente. Segundo ele, a situação é agravada pelo comportamento hostil da polícia, que tem se recusado a receber os Boletins de Ocorrência com a versão dos ameaçados.

O Relator afirma ainda que o poder de Chafick na região é tão grande que o julgamento dele e dos pistoleiros que participaram do massacre só deverá ter prosseguimento quando for transferido da comarca de Jequitinhonha, onde tramita, para Belo Horizonte. “O pedido de desaforamento do processo foi feito pela própria Juíza de Jequitinhonha, que reconheceu a impossibilidade de tramitar o processo em sua comarca”. No momento, apenas três envolvidos no massacre estão presos. Chafick e os sete jagunços já identificados pelas vítimas continuam aguardando julgamento em liberdade.

Situação fundiária e indenizações

Além da volta das ameaças contra os sem-terra, a situação fundiária em Felisburgo não teve avanço nestes últimos dois anos. Reivindicada pelo MST por ter sido parcialmente grilada por Chafick, a fazenda que foi ocupada pelo movimento teve 500 hectares declarados terra devoluta pelo estado logo após o massacre. O restante da fazenda de 1800 hectares pertenceriam a Chafick, mas o Incra teria se proposto a encaminhar a desapropriação para fins de reforma agrária. Até agora, no entanto, o processo não andou.

Outro processo estagnado é o de indenização pelo estado das famílias das cinco vítimas. Acusado de omissão por não ter evitado o crime apesar das reincidentes denúncias de ameaças por parte dos sem-terra, o governo do estado acordou com o movimento que se disporia a apoiar um projeto de lei na Assembléia Legislativa que criasse o mecanismo indenizatório.

Segundo Ronaldo Carvalho, assessor do deputado Rogério Correia (PT), autor do Projeto de Lei 2972/2006 que propõe a indenização de R$ 200 mil para cada família, no entanto, a Comissão de Fiscalização Financeira da Câmara, liderada pela bancada do governo, considerou o PL inconstitucional por tratar de “questão federal, a reforma agrária”.

Considerado pelo movimento um rompimento do acordo por parte das forças ligadas ao governador Aécio Neves, o MST fez uma cobrança formal a Aécio nesta terça (21).

Na carta enviada ao governador, o movimento afirma que quer lembrá-lo de que “logo após o massacre foi firmado um acordo em que o governo do Estado e a Assembléia Legislativa assumiram um projeto para a indenização e reparo parcial das perdas às famílias das vítimas na chacina. (...) No entanto, soubemos que a bancada de seu governo se recusa a aprová-lo, rompendo assim o seu compromisso. Por isso, vimos a sua presença pedir que oriente sua bancada a aprovar o projeto ainda neste ano e, dessa forma, as famílias podem obter pelo menos o conforto da sociedade mineira, reconhecendo os erros em torno da tragédia”.

Agencia Carta Maior, Internet, 22-11-06

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