Agricultura familiar, mais Agroecologia = sustentabilidade, mais alimentos saudáveis e menos aquecimento global
O Brasil é o país onde mais se avançou em termos de políticas públicas em favor da agroecologia, mas estas políticas estão ameaçadas.
5/05/2016 - Copyleft
Por Jean Marc von der Weid
A agroecologia está provando através de inúmeras experiências em todo o mundo que há modos verdadeiramente sustentáveis de se produzir alimentos saudáveis sem provocar o aquecimento global e até ajudando na sua reversão. Quem diz isso são pesquisas nos Estados Unidos, União Europeia, África, Ásia e América Latina. Realizadas pela UNCTAD, pela FAO, pela Academia Nacional de Ciências dos EUA, pela Universidade de Essex no Reino Unido, entre outras, essas pesquisas provam que os sistemas de produção agroecológicos são capazes de garantir o abastecimento da humanidade em alimentos e outros produtos de origem agrícola sem esgotar os recursos naturais não renováveis e preservando e recuperando os renováveis. Tudo isso pode ser feito a preços aceitáveis para os consumidores e permitindo uma dieta diversificada e com produtos de boa qualidade nutricional e isentos de agrotóxicos. Além disso, se toda a produção agropecuária adotasse este padrão de produção, a agroecologia permitiria a absorção no solo de todo o CO2 em excesso atualmente na atmosfera, bem como a anulação das emissões de origem agrícola para o futuro no espaço de apenas 10 anos.
A agroecologia tem como um obstáculo aparente o fato de que não é operável em larga escala, condenando ao desaparecimento os imensos latifúndios que hoje são a marca do agronegócio no Brasil e no mundo. Esses produtores baseados na agroquímica, nas espécies transgênicas e na moto-mecanização pesada estão fadados ao desaparecimento devido à sua dependência por insumos cujas reservas estão se acabando e pelo efeito destruidor de suas práticas sobre os solos, a água e a biodiversidade. A agroecologia opera na escala da produção familiar diversificada e serão necessários muitos mais agricultores no futuro se quisermos garantir as promessas da agroecologia. Isso significa, no Brasil, a necessidade da intensificação da Reforma Agrária numa escala ainda não imaginada. Nos Estados Unidos cientistas calculam que serão necessários 40 milhões de agricultores para garantir o abastecimento do país em bases agroecológicas. Se nos EUA essa conversão seria muito traumática e longa, no Brasil ainda temos uma demanda por terras reprimida e o potencial para dobrar o número de agricultores familiares em uma geração se adotadas as políticas necessárias.
O Brasil é, justamente, o país onde mais se avançou em termos da formulação de políticas públicas em favor da agroecologia. Através de vários mecanismos de participação da sociedade civil vinculados a vários ministérios desde o advento do governo Lula em 2003, foram formuladas políticas de crédito, assistência técnica e extensão rural, seguro, educação, pesquisa, convivência com o semiárido, abastecimento etc. Embora o nível de coerência, radicalidade a abrangência dessas políticas e programas tenha sido desigual, houve uma contínua progressão na direção da adoção dos conceitos da agroecologia no Plano Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, na Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural e no Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica.
Essas políticas, que são motivo de enorme interesse internacional, estão hoje ameaçadas pelo movimento de derrubada do legítimo governo da presidente Dilma. Por mais que tenha havido erros nos governos populares, a verdade é que eles não estão sendo hostilizados e ameaçados por esses erros, mas por seus acertos, tais como os acima apresentados. Enganam-se no entanto os defensores do agronegócio, das empresas de agrotóxicos, adubos químicos e sementes transgênicas que ameaçam o meio ambiente e a saúde de agricultores e consumidores se acham que vão varrer os agricultores familiares e a agroecologia do mapa da produção agropecuária brasileira. Tanto produtores como consumidores têm hoje uma maior consciência da importância desta alternativa sustentável para produzir de forma saudável e vão lutar pela manutenção do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e da Fundação Nacional do Índio (Funai), entre outros, e pelas políticas que dão suporte à transição agroecológica da agricultura familiar.
Buscando divulgar experiências e reflexões sobre o desenvolvimento da agroecologia no Brasil, a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e a Carta Maior lançam este especial, reunindo reportagens, entrevistas e artigos de especialistas em temas que incluem a segurança alimentar, a conservação da agrobiodiversidade e das águas, a pesquisa, o ensino, assistência técnica e extensão rural, as políticas públicas e programas voltados para a agricultura familiar, a questão agrária e muitos outros - informações e reflexões que nos ajudarão a entender por que interessa à sociedade apoiar a agroecologia e como podemos nos engajar nessa luta.
AS-PTA / Agricultura Familiar e Agroecologia
Fuente: Carta Maior