Brasil: transposição: seca é invenção da elite
Uma análise do documento com argumentos contrários à transposição, formulado no seminário convocado por frei Luiz Cappio, em Brasília (veja o texto nesta página), permite uma constatação: o governo mente, e mente muito. Toda a propaganda oficial gira em torno da redenção do povo sertanejo. Os 12 milhões de pessoas espalhadas pelo Semi-Árido, que sofrem os efeitos da seca, seriam beneficiadas pela água do Rio São Francisco
No entanto, o documento denuncia que o próprio relatório de impacto ambiental (Rima) da obra informa que a abrangência do projeto é de uma área de, no máximo, 7% do Semi-Árido. "90% do território continuara na mesma situação", prevê o texto. Além disso, as regiões supostamente beneficiadas pela transposição têm água suficiente para atender com segurança às demandas urbanas e agrícolas atuais. "O Ceará tem potencial para atender em até quatro vezes às demandas atuais por água para todos os seus usos; o Rio Grande do Norte, mais de duas vezes; e a Paraíba, uma vez e meia. Portanto, não existe déficit hídrico nos Estados beneficiados", decreta o documento.
Sendo assim, para que serve a transposição? Se a água não é para abastecimento humano e animal, ela só pode destinar-se a atividades econômicas, tais como irrigação, criação de camarão e usos industriais. O governo reconhece isso. Na página de internet do Ministério da Integração Nacional, principal empreendedor do projeto, lê-se o seguinte texto: "Embora o abastecimento doméstico possa ser, em princípio, suprido com os açudes existentes, o fato é que, em algumas bacias, o nível de comprometimento com os usos múltiplos da água vão se tornando críticos, com a prioridade dada aos usos urbanos interferindo com as atividades produtivas da população rural e até do consumo industrial. A inibição de atividades produtivas já aparece clara, por falta de planejamento de médio prazo ou por inviabilidade de novas outorgas d´água, na medida em que usuários já estabelecidos pressionam por manter seus direitos de uso, mesmo quando não prioritários para consumo humano. Os conflitos tendem a se agravar, tornando a gestão da água complexa e afastando o investimento privado, em face dos riscos envolvidos".
Segundo a interpretação feita pelos signatários do documento, o texto do ministério admite "que há água para o abastecimento doméstico na região". Ou seja, o problema é a "inibição de atividades produtivas", pois os "usuários já estabelecidos pressionam por manter seus direitos de uso, mesmo quando não prioritários para consumo humano". Além disso, a obra está orçada em R$ 4,5 bilhões. As empreiteiras da região, acostumadas às regalias da indústria da seca, esperam, ansiosas.
Luís Brasilino, enviado a Brasília (DF)
Fuente: Brasil de Fato