Brasil: atingidos por Belo Monte denunciam violação de direitos humanos frente a atitudes da Norte Energia e do Estado Brasileiro

Por MAB
Idioma Portugués
País Brasil

Para o MAB, o não reconhecimento dos moradores de Vitória do Xingu como atingidos por Belo Monte é uma violação aos direitos humanos e representa um retrocesso com relação ao conceito de atingido estabelecido no Decreto assinado pelo ex-presidente Lula no final de 2010.

 

Leia a carta aberta do Movimento sobre o assunto:

 

A construção de usinas hidrelétricas no Brasil tem causado inúmeras conseqüências sociais e ambientais negativas, como foi comprovado pelo relatório da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, ligada à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.

 

Estamos vivendo no Brasil um contexto de “desenvolvimento econômico” no qual a energia, vista como mercadoria, tem adquirido importância estratégica. Por isso, construir barragens para produzir energia elétrica cada vez mais é de interesse das grandes empresas.

 

Com estas obras, é possível garantir lucros extraordinários para quem as constrói, para quem vende máquinas e equipamentos e para as grandes indústrias eletrointensivas que consomem grande parte dessa energia produzida com subsídios. Enquanto isso, os trabalhadores pagam o preço dessa política de apropriação dos recursos naturais, da exploração do trabalho e da exclusão social.

 

O modelo energético brasileiro é pautado na construção de hidrelétricas, sob o comando de um setor privado que controla desde a produção até a venda dessa energia. O Estado permite, em nome do “desenvolvimento”, essa lógica de exploração e acumulação privada de setores estratégicos, perdendo a possibilidade de construir uma soberania nacional.

 

A usina hidrelétrica de Belo Monte faz parte dessa política e do modelo energético brasileiro. Para a sociedade, dizem que esse projeto é a chegada do “desenvolvimento” à uma região “esquecida” e “atrasada”. Para a população local, fazem um discurso da chegada do “progresso”, porém, o que está acontecendo novamente é a violação dos direitos humanos.

 

Uma das formas dessa violação é o não reconhecimento como atingidos de pessoas que têm, de fato, seu modo de vida alterado pela imposição da barragem. Essa estratégia, adotada pelas empresas para aumentar seus lucros e passar uma imagem de sustentabilidade, é um claro retrocesso em todo um processo de luta e debate encampado pelos atingidos por barragens, organizados no Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), junto à sociedade e ao governo.

 

Na jornada do 14 de março de 2012, Dia Internacional de Luta Contra as Barragens, o Movimento dos Atingidos por Barragens, juntamente com outras entidades, realizou várias mobilizações em todo o país. Em Altamira, os atingidos se mobilizaram mais uma vez contra Belo Monte e em defesa dos direitos humanos dos atingidos. Pressionada, a Norte Energia se viu obrigada a receber uma comissão dos atingidos, que resultou em acordos, como a audiência pública realizada em Vitória do Xingu, à jusante da barragem, com a participação de mais de 2000 pessoas. Lamentavelmente, a Norte energia disse publicamente que não reconhece esta como área impactada.

 

O não reconhecimento dos moradores de Vitória do Xingu como atingidos por Belo Monte é um retrocesso com relação ao conceito de atingido estabelecido em um decreto assinado pelo ex-presidente Lula no final de 2010. Naquele documento, se incluíam no conceito de atingido todos aqueles cuja atividade econômica fosse afetada pelo empreendimento. Nesse caso se enquadram os pescadores de Vitória do Xingu, que denunciam que a diminuição do fluxo das águas prejudicará irreversivelmente seu sustento.

 

Além desse caso em especial, há exemplos em vários aspectos da vida social em que fica claro o desrespeito e a violação de direitos humanos impostos por Belo Monte:

 

1) As empresas e o governo, responsáveis pela usina, propagam a imagem de uma obra que vai resolver os problemas do povo, além de dizerem ser a primeira usina hidrelétrica sustentável. No entanto, Belo Monte é um acordo entre grandes grupos econômicos, que desconsideram as necessidades da população e ignoram as denuncias e alertas de entidades e organismos internacionais. As 40 condicionantes e mais 23 exigências do IBAMA não foram respeitadas. Uma multa de sete milhões de reais, aplicada pelo IBAMA, não tem nenhum efeito prático, pois a obra da barragem continua a pleno vapor.

 

2) Passados apenas oito meses desde o início da obra, os impactos negativos já estão visíveis: milhares de pescadores já encontram dificuldade no seu pescado, e estão totalmente inseguros quanto ao seu futuro. Povos indígenas já sentem que estão perdendo o rio. Na cidade de Altamira, o custo de vida e a violência cresceram assustadoramente, o trânsito virou um caos, faltam vagas nas escolas e a assistência à saúde, que já era precária, piorou ainda mais. Altamira e região não foram preparadas para receber a obra de Belo Monte.

 

3) Uma Comissão ligada ao Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana visitou Altamira em setembro de 2011 e constatou que a usina é, hoje, fator importante no crescimento dos conflitos em geral na região, em especial a violência contra crianças e adolescentes. Para além dos números, a população de Altamira tem sentido isso nas ruas.

 

4) Cresce o aparato repressivo na região por conta de Belo Monte, com o objetivo de fazer pressão psicológica para controlar qualquer resistência. Isso ficou claro nas atividades de mobilização social da jornada do 14 de Março, Dia Internacional de Luta contra as Barragens, em Altamira. O que vemos é uma política de aparelhamento das estruturas de segurança pública para prestar serviços para as empresas donas da barragem.

 

5) Existe uma intensidade na exploração dos trabalhadores nas obras para garantir altas taxas de lucros. Os operários que buscaram se organizar e reivindicar seus direitos, negados pelas empresas, foram sumariamente demitidos e criminalizados.

 

6) Mais uma vez, multiplicam-se as táticas de convencimento do povo e das autoridades sobre supostos benefícios dessa obra, que vão desde cursos até ‘doação’ de equipamentos, para que deixem de questionar a construção da obra, em uma clara tentativa de cooptação.

 

O Movimento dos Atingidos por Barragens seguirá na luta contra a violação dos direitos humanos dos atingidos por barragens, contra a construção de usinas hidrelétricas que só favorece o modelo energético implantado, e repudia as políticas da Norte Energia e do Estado brasileiro. Portanto, reafirmamos nossa posição contra Belo Monte e em defesa da Amazônia.

 

Coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens

Fonte: MAB

Temas: Megaproyectos

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